Ponta da Praia, último reduto caiçara na Ilha de São Vicente

Em homenagem à Semana da Cultura Caiçara, vamos abordar no Memória Santista de hoje o tempo em que a Ilha de São Vicente, no nascer do Século XX, ainda guardava um traço tipicamente caiçara, abrigando comunidades de pescadores artesanais e gente que vivia como os primeiros colonos que aportaram neste terra alguns séculos antes.

Atraídos ao canal do estuário (hoje totalmente tomado pelo Porto de Santos), de águas quentes e abrigadas, dezenas de espécies de peixes migravam para estas paragens a fim de procriar, o que tornava o local um ambiente ideal para a pesca de arrastão (rede). Distante da cidade (atual Centro Histórico) e seus problemas urbanos, as comunidades caiçaras ocupavam tranquilamente as margens do estuário, principalmente o lado que ficava bem na curva da ilha, onde hoje está o bairro da Ponta da Praia.

Ali, viviam da pesca, da criação de animais como porcos e galinhas, de caças esporádicas (macucos, gambás e porcos do mato) e do pouco que conseguiam plantar no terreno lagadoso local (mandioca, feijão). Os caiçaras da Ponta da Praia normalmente comercializavam o pescado que pegavam na cidade e, com o dinheiro, compravam outros tipos de alimentos.

Com o advento do bonde (de tração animal), a partir de 1871, a região testemunhou a chegada do progresso. No entanto, ao contrário de outros trechos da orla, como o Gonzaga, o José Menino e o Boqueirão, a Ponta da Praia demorou bastante a perder as suas características caiçaras. Nem mesmo a chegada dos clubes de regatas, a partir de 1898, e a construção da Escola de Aprendizes Marinheiros (atual Museu de Pesca), em 1909, foram suficiente para alterar a vida cotidiana dos pescadores e suas famílias. Assim, não era raro ver canoas e redes de pescadores em meio aos barcos esportivos dos clubes e os veleiros dos alunos marinheiros.

Mas o progresso insistente não perdoou. Com a chegada do asfalto, do bonde elétrico, dos carros e da especulação imobiliária, as comunidades caiçaras ponta praianas foram se afastando de Santos, migrando para cada vez mais longe . O canal do Estuário, então, acabou tomado em suas duas margens por terminais marítimos, o que determinou o afastamento dos cardumes que aqui vinham depositar seus ovos. Atualmente, os redutos sobreviventes de caiçaras em terras santistas se concentram na Ilha Diana e, em menor escala, no Monte Cabrão e no Caruara (todos na área continental). Estes são os raros descentes das comunidades da Ponta da Praia, local que um dia foi o paraíso caiçara na Ilha de São Vicente.

Ponta da Praia em 1900. O bonde (tração de animal) trouxe o progresso à comunidade caiçara, mas também determinou o início do fim da vila, que foi desaparecendo aos poucos, substituída pelas sedes dos clubes de regatas.
Ponta da Praia em 1900. O bonde (tração de animal) trouxe o progresso à comunidade caiçara, mas também determinou o início do fim da vila, que foi desaparecendo aos poucos, substituída pelas sedes dos clubes de regatas.
Ponta da Praia na década de 1920. Outro progresso, a eletricidade, já faz parte da vida dos caiçaras locais.
Ponta da Praia na década de 1920. Outro progresso, a eletricidade, já faz parte da vida dos caiçaras locais.
Casa caiçara na Ponta da Praia na década de 1940.
Casa caiçara na Ponta da Praia na década de 1940.
As canoas caiçaras faziam parte da paisagem da praia defronte aos clubes de regatas.
As canoas caiçaras faziam parte da paisagem da praia defronte aos clubes de regatas. Foto nos anos 1940.
Ponta da Praia nos anos 1940. Nota-se o trampolim de saltos ornamentais utilizados pelos atletas dos clubes de regatas. A comunidade caiçara já começava a ficar acuada e pequena.
Ponta da Praia nos anos 1940. Nota-se o trampolim de saltos ornamentais utilizados pelos atletas dos clubes de regatas. A comunidade caiçara já começava a ficar acuada e pequena.
Canoas de pescadores caiçaras nos anos 1950. Praticamente não havia mais habitação de pescadores. Os barcos ainda insistiam em ficar, mas logo também desapareciam quando da urbanização local.
Canoas de pescadores caiçaras nos anos 1950. Praticamente não havia mais habitação de pescadores. Os barcos ainda insistiam em ficar, mas logo também desapareciam quando da urbanização local.

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