Um dos maiores e piores pesadelos da história de Santos. Este era o sentimento geral dos colonos da pequena vila portuária nos dias que se sucederam à noite de Natal de 1591. Haviam-se passado oito anos desde a malfadada batalha na Baia de Santos entre os corsários de Edward Fenton e os homens do reinos de Portugal e Espanha (unificados desde 1581), que resultou na fortificação da entrada do canal do estuário, com o erguimento da Fortaleza da Barra Grande. Dali em diante, a sensação era de alívio e segurança. Afinal, todos acreditavam que ninguém seria corajoso o suficiente para enfrentar os canhões das fortalezas santistas, muito bem guarnecidas desde então.
Porém, para toda regra há uma exceção, ou para todo desafio há quem o supere. Foi o caso da mente astuta e, de certa forma cruel, do corsário inglês Thomas Cavendish, que espertamente avançou sobre o canal do estuário justamente na noite de Natal, sabendo que, em função do recolhimento religioso, as forças militares em terra haveriam de relaxar. E não deu outra. Sem resistência, as naus de Cavendish adentraram o canal do estuário e se posicionaram tranquilamente à porta da vila de Santos. Era noite, e todos se reuniam na Matriz para a missa de Natal. Alvo fácil e indefeso.
Dezenas de piratas desceram à terra e iniciaram uma das mais cruéis destruições da história santista, queimando casas, depredando prédios públicos e não poupando nem mesmo as igrejas. Até mesmo a santa predileta dos colonos, Santa Catarina de Alexandria, cuja imagem situava-se harmoniosa na pequena capela localizada no sopé do outeiro de propriedade da família Góes, não foi poupada.
Ensandecidos, os piratas entraram na pequena casa religiosa e tiveram o atrevimento de toma-la nos braços, carrega-la pela praia, conduzirem-na em um bote, somente para atirá-la no lagamar. Os piratas tomaram a vila e por lá ficaram quase dois meses, assaltando as fazendas e vilarejos próximos. Deixaram um rastro de destruição e mortes para trás.
Quanto à imagem de Santa Catarina de Alexandria, ela ficou desaparecida, mas não para sempre. Pescadores escravos do Colégio dos Jesuítas, numa atividade com rede de arrastão, encontraram-na no fundo do lagamar, 72 anos depois. Felizes, os santistas reconstruíram sua capela, desta vez no alto do Outeiro, que levou o seu nome, e lá ficou até meados do Século XIX, quando a edificação foi demolida. A imagem hoje se encontra no Museu de Arte Sacra e é considerada o objeto mais antigo ainda existente da história de Santos.