Era tarde de quinta-feira, dia 10 de setembro de 1942. Centenas de pessoas, muitas delas crianças, se aglomeravam na Praça Mauá e em todo o seu entorno para inaugurar a primeira “pirâmide de metal” da cidade, batizada de “Monte Serrat”. O objetivo era arrecadar o quanto possível fosse de metais, junto à população, para serem encaminhados às fábricas do interior para que fossem transformados em material bélico de uso das Forças Armadas do Brasil, que havia dois meses declarara guerra contra os países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão). Cidade portuária, Santos já vivia desde o ano anterior, o clima de guerra batendo à sua porta, ainda mais sabendo ser localização estratégica e alvo potencial dos submarinos nazistas.
As chamadas pirâmides de metal nada mais eram do que amontoados, em pilhas, de objetos metálicos de todos os tipos, que começavam a ser construídos em várias partes do país, a partir da declaração de guerra. Em Santos, coube à Guarda Noturna, à Rádio Atlântica e ao jornal A Tribuna, a iniciativa de convocar os santistas para o chamado “esforço de guerra”, similar ao que já havia acontecido na cidade, por exemplo, durante a Revolução Constitucionalista de 1932, quando ocorrera a arrecadação de metal em favor dos bravos soldados paulistas, que lutavam contra o regime do presidente Getúlio Vargas.
A campanha tinha a missão de “angariar todo material inservível para o uso doméstico, mas que, fundido, concorreria para oferecer armas ao Brasil”. O primeiro posto foi justamente o da Praça Mauá, cujo primeiro objeto doado foi uma vistosa estatueta de metal que pertencia ao então prefeito Antônio Gomide dos Santos. Após o ato inaugural, centenas de santistas depositaram panelas e outros utensílio do cozinha, pedaços de mobiliário, brinquedos de metal e até capacetes que pertenceram a ex-combatentes de 1932, como o de Osvaldo Franco Domingues, que na época deixou a seguinte mensagem, publicada no jornal A Tribuna: “Há alguns anos eu vinha assim procedendo, guardando para meus filhos, com veneração, minha relíquia. No momento, entretanto, nem mesmo a vida nos é lícito negar à nossa querida terra. Essa razão pela qual, nesse instante, em que a gloriosa pátria requer armas, não tenho dúvida em desfazer-me do objeto que esta acompanha”. O gesto de Osvaldo foi seguido por outros diversos ex-combatentes naquele esforço de guerra.
Nos dias e semanas seguintes, os santistas construíram outras pirâmides, como as dos bairros do Boqueirão, Gonzaga e Ponta da Praia (Escolástica Rosa). Além das pessoas, várias empresas se empenharam na tarefa de fazer crescer as pilhas, como o Parque Balneário Hotel, que enviou caminhões com ferro velho de camas, equipamentos de cozinha e lavanderia, além de esquadrias.
Os clubes e os colégios da cidade também se envolveram de forma “patriota na tarefa. O Clube XV e o Tênis Clube, por exemplo, disponibilizaram aos seus sócios postos de arrecadação exclusivos. O Colégio Canadá, por iniciativa do professor de história, Dr. Avelino Vieira, montou sua própria pirâmide, batizada de “Duque de Caxias”.
O sucesso da campanha foi total. A Comissão de Metalurgia do Governo Federal teve até de apelar às empresas de transporte particular para que enviassem o material arrecadado para as fábricas e arsenais do Exército Brasileiro. No final de 1942, todo o metal santista já havia sido coletado.
Nos anos seguintes outras campanhas foram criadas (principalmente pela borracha). Mas a do metal ficou marcada como uma das uniões mais espontâneas da população santista em torno de uma causa, um verdadeiro esforço de guerra.
fonte de pesquisa: Soldados da Retaguarda (Manoel Pereira de Souza)