O ano era 1887. A cidade portuária de Santos crescia a olhos vistos, testemunhando um aumento substancial na circulação de produtos para exportação, em especial o café, graças à chegada da ferrovia vinte anos antes. A geografia da urbe santista, tornada cidade em 1839, já não cabia mais no pedaço de chão historicamente ocupado pela velha vila colonial, entre o Valongo e o Outeiro de Santa Catarina, e se expandia rapidamente para a ponta nordeste da Ilha de São Vicente, onde viu nascer, nos anos 1870, um novo bairro, o Paquetá, que logo se tornaria o lugar predileto de moradia para abastados comerciantes e estrangeiros influentes.
Santos optou em não ampliar sua urbe para o lado oposto (região da entrada da cidade) e, com o advento do transporte em bondes (puxados a tração animal), a partir de 1871, a estratégia passou a ser ocupar as áreas situadas na zona leste, em especial na faixa costeira do que os santistas chamavam de “Praia da Barra” (que corresponde hoje a praticamente toda a orla de Santos).
A primeira via conhecida para esta, até então, longinqua paragem, era o “Caminho da Barra”, que correspondia ao atual traçado das ruas Bras Cubas, Luis de Camões e Osvaldo Cruz, formada na primeira metade do século 19. Mas a longa estrada, tortuosa e repleta de trechos alagadiços, com o passar dos anos, foi se deteriorando e tornando-se um enorme problema, a ponto de obrigar as autoridades mandarem abrir um outro traçado, mais seguro, seco e em linha reta. Foi então que nasceu a futura avenida Conselheiro Nébias.
Alguns nomes antes de Nébias
O novo traçado foi batizado, assim que concluído, do modo mais popular e simples possível: “Novo Caminho da Barra”. E foi por esta estrada de terra batida que Santos viu pela primeira vez o bonde, pioneiro no Estado de São Paulo, em 1871. Isso aconteceu quando a via era dividida em duas partes, sendo que, no trecho da cidade, recebia o nome de Rua da Liberdade. Em 1873, ano seguinte da morte do ilustre santista Joaquim Octávio Nébias (o Conselheiro Nébias), as autoridades resolveram rebatizar a via como Rua Octaviana. Cinco anos depois, houve a tentativa de novamente trocar-lhe o nome, para Rua Independência (esta nomenclatura chegou a constar em alguns documentos porém, por pouquíssimo tempo), mas a coisa não agradou algumas pessoas, como o vereador Xavier Pinheiro, que trabalhou arduamente para derrubar a ideia e devolver à estrada o nome do velho conselheiro, o que foi consolidado na sessão da Câmara Municipal em 22 de agosto de 1878.
O nome definitivo
Em 10 de fevereiro de 1887, outro vereador, João Manuel Alfaia Rodrigues Júnior, fez uma indicação para que a municipalidade trocasse o nome da Rua Octaviana para Rua Conselheiro Nébias, tornando mais clara a homenagem ao homem que era considerado, depois dos irmãos Gusmão (Padre Bartolomeu e Alexandre), dos irmãos Andradas (José Bonifácio, Martim Francisco e Antonio Carlos) e do Visconde São Leopoldo (José Feliciano Fernandes Pinheiro), o mais importante e influente da história de Santos.
Testemunha da vanguarda santista
A Conselheiro Nébias, misto de rua (entre o Porto e a Rua Bittencourt) e avenida (dali até a orla) se tornou uma artéria vital para a expansão de Santos e sua consolidação como urbe vanguardista. Às suas margens, surgiram imponentes casarões e locais como o Recreio Miramar que, além de ser reconhecido como um dos centros de lazer mais imponentes da América do Sul, foi palco da segunda exibição cinematográfica do Brasil (1897) e da primeira estação de rádio santista (Rádio Clube de Santos, a terceira do país, criada em 1924). A avenida também foi a primeira da cidade a experimentar a iluminação pública por energia elétrica (1902), além do já mencionado transporte por bonde (1871).
A via acolheu boa parte da alma cultural, social e educacional santista na primeira metade do século 20. Escolas como a Associação Instrutiva José Bonifácio (1907), Stella Maris (1924), Liceu São Paulo (1927) e Ginásio Luso Brasileiro (de 1910, onde nasceu o Centro dos Estudantes, em 1932, a primeira entidade estudantil do Brasil) ditaram o rumo da capacitação profissional de centenas de jovens. A Faculdade Católica de Direito, instalada na famosa Casa Amarela (1953), também ali criou fama.
Entidades culturais como o Instituto Histórico e Geográfico (1938) se desenvolveram na famosa avenida. Espaços de lazer únicos, como o Parque Indígena (1909), a Vila dos Pássaros (1932), Museu Santista (1926), e os cinemas também constituíam um diferencial para a cidade, isso sem falar nos desfiles escolares e de Carnaval, além de atrações esportivas de alcance internacional.
Enfim, a Conselheiro Nébias, que completa 130 anos em fevereiro de 2017, fez jus ao seu homenageado, um homem que começou sua trajetória política aos 24 anos de idade, como deputado provincial em 1835, reeleito em sucessivas legislaturas até alcançar o posto de presidente da Assembleia Provincial de São Paulo. Foi deputado à Câmara Geral em 1859-1860; juiz de Direito de Paranaguá (1841-1843); vice-presidente e presidente da Câmara Geral; juiz do Tesouro em Itu e Sorocaba; presidente da Província do Rio Grande do Sul (1852); presidente da Província de São Paulo (também em 1852); senador do Império em 1856; ministro da Justiça, em substituição a José de Alencar; juiz de Feitos da Fazenda e conselheiro imperial de d. Pedro II (daí a alcunha que o tornou mais conhecido). Com tantas atividades, não encontrou tempo para o amor e, solteiro, faleceu aos 61 anos de idade, no Rio de Janeiro, em 16 de julho de 1872.