18 de dezembro de 1967. Eram quase oito horas da noite, quando vários carros se acumulavam na porta e nas cercanias da Associação dos Médicos de Santos (Av. Ana Costa, 388). Deles, saltavam homens de branco, entusiasmados por terem tomado a decisão de enfrentar a conjuntura que infligia altas perdas à classe médica brasileira, assim como à imensa massa de pessoas que, diariamente, buscava um atendimento digno e satisfatório de saúde. Havia algum tempo, a medicina vinha sendo mercantilizada no país, prejudicando sobremaneira pacientes e médicos. Mas, na terra da caridade e da liberdade, berço do primeiro hospital brasileiro e de tantas lutas trabalhistas, de inúmeras bandeiras libertárias, aquela situação não poderia mais ser aceita. Os médicos santistas, assim, estariam prestes a fazer jus à trajetória histórica de Santos, e constituiriam um sistema de atendimento de saúde que tornar-se-ia modelo para o Brasil e para o mundo.
Antecedentes históricos
No início da colonização, cuidar da saúde significava ter que “se virar por conta própria”. A medicina se dava de modo informal e o paciente acabava apelando para curandeiros e alguns poucos autodidatas. A cidade de Santos, em 1543, surpreendeu a jovem colônia com a implantação do primeiro hospital brasileiro, calcado no modelo das Santas Casas de Misericórdia que existiam no Reino de Portugal. Assim, os santistas se tornaram privilegiados diante de outras localidades tupiniquins.
A situação na Colônia só começou a melhorar quando da chegada da família real portuguesa, em 1808. Acostumados com um padrão de vida requintado e uma estrutura urbana organizada, os novos habitantes, membros da Corte, se reuniram para criar cursos de medicina, com o objetivo de formar médicos para atender as necessidades da elite que se desenvolvia no Brasil. Mas, como se pode supor, os atendimentos eram de caráter particular, não havendo, portanto, política de saúde pública, passo este que só veio a ser dado após a Proclamação da Independência, quando foram criados institutos para tratar de questões epidêmicas. A população passou a ter, ao menos, direito à vacinas.
Esta política de concentrar ações públicas nas questões sanitárias e de higiene se arrastou até 1923, ano em que foi promulgada a Lei Elói Chaves, que estabeleceu a criação das chamadas Caixas de Aposentadoria e Pensão, mantidas e geridas pelas empresas. Elas ofereciam serviços médicos aos seus funcionários e famílias, além de descontos em medicamentos, aposentadoria e pensão para herdeiros. Com a ascenção de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, finalmente o governo brasileiro resolveu assumir as questões de saúde pública, criando, inclusive, um ministério para isso, ainda que dividido com outra pasta (Ministério da Educação e Saúde). Ao mesmo tempo, as Caixas de Aposentadoria e Pensão foram substituídas pelos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs), deixando de ser gerenciados pelas empresas e passando a ser controlados por entidades sindicais.
Anos 60
O sistema controlado pelos sindicatos sobreviveu até 1960, quando foi criada a Lei Orgânica da Previdência Social, que unificava os IAPs de cada entidade sindical em um só regime e consolidava as leis trabalhistas. Trabalhadores rurais, empregados domésticos e funcionários públicos, no entanto, continuavam de fora. Em 1967, após o golpe militar, criou-se o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que de fato unificou os IAPs. Porém, como a demanda da população por serviços de saúde ultrapassava a capacidade de oferta do governo, o déficit acabou sendo coberto pelo sistema privado, que recebia grandes repasses financeiros, o que culminou num grande crescimento da rede privada de hospitais no país.
Com isso, acabou-se criando um celeuma entre os profissionais da saúde e as empresas privadas do setor. Os médicos alegavam que a falência do sistema público de saúde e o surgimento de inúmeras empresas de medicina de grupo transformavam a saúde numa atividade econômica como outra qualquer, com claro objetivo de lucratividade. Para os médicos, o fato significava uma grande ameaça à prática liberal da medicina, no consultório, e uma “pá de cal” na relação médico-paciente, de medicina humanizada.
A Unimed
Foi justamente neste contexto social e político que surgiu, entre os médicos de Santos, a ideia de criar uma cooperativa (lastreada pela Lei 60.597, de 19 de abril de 1967), como um modelo alternativo e democrático de organização, que permitia fortalecer a ética médica e dignificar o paciente, oferecendo assistência personalizada e de qualidade.
Assim, quando os 23 fundadores da Unimed Santos subscreveram a criação da entidade, liderada inicialmente pelo ginecologista e obstetra Edmundo Castilho, ao mesmo tempo subscreviam um ato pioneiro, inovador.
As sedes
A Unimed Santos ocupou, inicialmente, as instalações de um casarão que existiu na Avenida Ana Costa, 439, antiga sede do Instituto Ortopédico São Lucas, inauguado com a presença do então prefeito Silvio Fernandes Lopes. E ficou ali até 1971, quando se transferiu para o outro lado da rua (Ana Costa, 430), onde até hoje mantém suas áreas de mercado (vendas) e atendimento.
De lá para cá, a cooperativa ampliou suas unidades, em especial no novo milênio, com a aquisição, em 2002, do imóvel da Avenida Ana Costa, 211. Na sequencia vieram, o Pronto Atendimento de Santos, na Avenida Conselheiro Nébias, 730 (2006); o Núcleo de Atenção à Saúde (NAS), na Rua Joaquim Távora, 190 (2007), a Unidade de Negócios, na Rua Amador Bueno, 155, Centro (2008), Pronto Atendimento de Praia Grande (2010), Cubatão (2014) e Mongaguá (2016).
No terreno da Vila Mathias, a cooperativa, que lá instalou o SOU e o Viver Bem, pretende iniciar, em 2018, a construção do Centro Médico Unimed (sete pavimentos e subsolo, totalizandomais de 11 mil metros quadrados de área construída), que representa o embrião do futuro Hospital Unimed Santos, um antigo sonho da entidade.
A Unimed Santos hoje
A cooperativa, que nasceu com 23 médicos, hoje abriga em seu cadastro 1.400 profissionais cooperados ativos, responsáveis pela assistência a 190 mil beneficiários nos municípios de Santos, São Vicente, Cubatão, Praia Grande, Mongaguá, Itanhaém, Peruibe, Itariri e Pedro de Toledo.
Um sistema exemplar
Ao longo destes 50 anos, completados no último dia 18 de dezembro, os preceitos da Unimed santista inspiraram outras localidades. Hoje, existem no país 347 Unimeds, todas atuando integradamente. O sistema, nascido em Santos, reúne atualmente 113 mil médicos cooperados e cuida da saúde de mais de 18 milhões de pessoas. Mais um pioneirismo que nos orgulha!