Congresso: o vovô dos desfiles carnavalescos

Como uma agremiação carnavalesca promove o seu desfile de rua? Bom, basicamente você diria que ela divide seus componentes em várias partes (ou alas), como a comissão de frente, a ala das baianas, a bateria, os mestres-salas e porta-bandeiras, além de carros alegóricos com destaques e diversos foliões fantasiados de acordo com o enredo escolhido para o ano. Ok? Certo! Mas, como se dava isso lá no início da história do Carnaval Santista?

Como já abordamos aqui neste blog, o Carnaval de Santos é o único do Brasil que possui uma certidão de nascimento, ou seja, uma data exata de surgimento. É que em 14 de fevereiro de 1858 foi criada a Sociedade Carnavalesca Santista, que pôs fim às festividades violentas do entrudo (espécie de comemoração de influência lusitana ocorrida nos três dias que antecediam o período de Quaresma). A partir daquele ano, a população santista passou a comemorar o Carnaval de forma mais civilizada, através de bailes de máscaras e um festejo conhecido como CONGRESSO.

O Congresso, podemos dizer, é o avô dos desfiles carnavalescos atuais, assim como as SOCIEDADES CARNAVALESCAS, a avó das atuais Escolas de Samba. Já em 1858, a Sociedade Carnavalesca Santista promoveu o primeiro congresso nas ruas da cidade. E, assim como uma escola de samba, também tinha uma estrutura definida. A primeira ala era formada pela BANDA DE MÚSICA (seria o equivalente à atual bateria e seus puxadores, mesclado com a comissão de frente). Era essa banda de música quem ditava o ritmo do desfile (ou melhor, do Congresso!!!). Na sequência vinham os grupos de mascarados (pessoas fantasiadas), que podiam se apresentar à pé (equivalente às alas dos dias de hoje), a cavalo ou até mesmo em veículos como charretes, carruagens ou caleças (podemos dizer que equivaleria aos carros alegóricos e seus destaques). Havia também, no meio dos mascarados, o carro com o estandarte (bandeira) da sociedade carnavalesca, normalmente carregado pelo presidente da agremiação, devidamente trajado com uniforme de gala!!!!! (seria o equivalente à porta-bandeira, sem um mestre-sala).

Só para se ter uma ideia da diferença entre o ontem e o hoje, naquela época ninguém sonhava em ver um desfile com mulheres em trajes minúsculos (ou sem traje mesmo!), como madrinhas de baterias ou coisas do gênero. Os participantes dos congressos vestiam-se de forma comportada e muita vaidade. A diversão dos jovens era oferecer ramalhetes de flores e confeitos (doces) às donzelas que assistiam os desfiles das portas ou janelas de suas casas de estilo colonial (afinal, os congressos percorriam praticamente todas as ruas da cidade de Santos).

Os jovens mascarados mais ousados, trajados com túnicas compridas e luxuosas, chegavam mais perto dos curiosos espectadores e soltavam frases do tipo: “Você me Conhece?”, que se tornou, de acordo com o historiador Bandeira Júnior, o precursor do prepotente brasileirismo “Você sabe com quem está falando?”

Com o passar dos anos, os congressos foram se moldando e aperfeiçoando, principalmente no tocante aos carros enfeitados. Muitos deles traziam críticas à sociedade e à política. Um exemplo claro disso aconteceu no Congresso realizado em 1884 pelo “Grupo dos Meteoros”, sociedade carnavalesca formada por foliões da Rua 25 de Março (atual XV de Novembro). Na época, o assunto mais discutido na Câmara Municipal, assim como nos botequins e ruas da cidade, era a lotação esgotada do Cemitério do Paquetá, o que obrigava a Intendência (Prefeitura da época) a buscar soluções para a criação de um novo espaço para sepultamentos. Espirituosos, os “Meteoros” resolveram pinicar as autoridades saindo fantasiados, em seu Congresso, de esqueletos. No carro de abertura do desfile, um cartaz dizia: Para onde Vamos?

Ainda no Século XIX, além das bandas de música, foram agregando aos congressos, os grupos “Zé-Pereira” (Nome adotado para os foliões que percorriam as ruas da cidade dando pancadas em enormes tambores e produzindo decibéis em níveis extremamente elevados para os padrões da época. O zé-pereira poderia ser representado por um folião solitário e também por grupos de carnavalescos, todos com os seus tambores, desfilando pelas ruas e visitando as redações dos jornais, como era o hábito dos foliões que se julgavam merecedores de aparecer na imprensa).

Os Zé-Pereiras foram, assim, os avôs das baterias das atuais escolas de samba.

Outra curiosidade dos primeiros desfiles de Carnaval em Santos foi a introdução dos confetes e serpentinas na folia. Isso aconteceu quando os congressos passaram a acontecer nos períodos noturnos, logo depois de a cidade passar a utilizar a iluminação pública à gás, o que melhorou muito as condições de visibilidade nas ruas. Os confetes e serpentinas substituíram os ramalhetes e confeitos, porque eram mais baratos e democráticos. A partir daí, nasceram as grandes batalhas de confetes, que se tornaram tradicionais até os anos 1980.

Em breve, falaremos um pouco das primeiras sociedades carnavalescas de Santos, incluindo o ainda existente Clube XV, que nasceu por causa do Carnaval.

Clube dos Girondinos. Esta é uma rara foto de uma agremiação de Carnaval da época dos Congressos. Nota-se que entre os distintos membros há foliões mais desinibidos.
Clube dos Girondinos. Rara foto de uma agremiação de Carnaval da época dos Congressos. Nota-se que entre os distintos membros há foliões mais desinibidos. Clique na foto para ver maior.

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