Depois da Primeira Guerra Mundial, as forças italianas de cruzadores, separadas dos batedores e dos obsoletos navios de convés blindado, consistiam em apenas quatro exemplares integrantes das classes Garibaldi e Pisa, todos construídos no início do século XX. Estas embarcações de guerra já não serviam mais para a função por serem muito lentas. Destarte, após a assinatura do Tratado Naval de Washington (1922), que estabelecer novos parâmetros para a construção de cruzadores (deslocamento total de 10.000 toneladas e calibre de armamento primário não superior a 203 mm), os engenheiros italianos passaram a projetar navios da nova classe “Washington”. Afinal, era preciso criar nos estaleiros navios capazes de imprimir alta velocidade. O item blindagem, assim, deixou de ser prioridade. No entanto, os engenheiros navais da Marinha Real de Guerra Italiana mantiveram em seus projetos a instalação de cinturões blindados de 70 mm de espessura.
Em 1924, todo o planejamento construtivo estava concluído e, em 1925, dois navios da nova classe começaram a ser montados no estaleiro de Orlando, em Livorno – o Trento e o Trieste. O Trento foi lançado ao mar no dia 4 de outubro de 1927, e imediatamente se tornou o navio líder da recém-formada Divisão de Cruzadores. Era uma verdadeira fortaleza naval, contando com oito canhões de oito polegadas em torres duplas; 12 canhões de 4 polegadas e seis de pequeno calibre, além de quatro tubos lança-torpedos conjugados, dois a dois. O navio também tinha uma catapulta para o lançamento de hidroaviões e podia carregar três deles a bordo.
O Trento media 210 metros de comprimento por 22 metros de boca, com um calado de 19 pés. Sua tripulação era composta de 44 oficiais, 104 suboficiais e 721 marinheiros, ou seja, 869 pessoas, uma verdadeira cidade flutuante.
Em agosto de 1929, esta máquina de guerra do Reino da Itália veio ao Brasil em missão diplomática, numa demonstração dos laços de amizade entre os dois países. No dia 7, a embarcação chegou ao Rio de Janeiro, a então capital brasileira. Depois de receber representantes da embaixada italiana no Brasil e vários oficiais da marinha brasileira, o comandante do Trento e chefe da missão diplomática, comandante Wlademiro Pini, recebeu a bordo de sua embarcação o presidente da República, Washington Luís, no dia 10 de agosto.
A escala seguinte no Brasil seria o Porto de Santos, porta de entrada da maior parte da colônia italiana no país. Muitos dos marinheiros do Trento possuíam parentes que migraram para o Brasil havia anos e alguns manifestaram o desejo de revê-los ou até conhecê-los pessoalmente (havia muitos jovens que desconheciam até mesmo o paradeiros destes parentes). A imprensa paulista anunciava em letras garrafais a chegada do Trento ao Porto de Santos, o que atraiu muita gente ao cais no dia 17. Na programação estava inserida a possibilidade de o povo conhecer o vaso de guerra por dentro, por todos os dias em que ele estivesse atracado, das 15 às 17 horas.
Atração em Santos
O Trento atracou às 16 horas do dia 17 de agosto de 1929 no cais do armazém 5, perto da Velha Alfândega (ela estava sendo demolida para dar lugar a uma nova alfândega, que seria inaugurada em 1934) e foi recebido por autoridades da marinha, da cidade de Santos, do governo do Estado, do Consulado Geral da Itália em São Paulo, representado pelo próprio cônsul Serafino Mazzolini, do cônsul em Santos, Leone Sircana e de várias associações italianas.
Nos dias em que permaneceram em Santos, o comandante Pini e demais oficiais foram recebidos com festa na sede da Sociedade Italiana de Beneficência, almoçaram no restaurante da Sociedade de Elevadores Monte Serrat, no alto do morro, onde visitaram a capela de Nossa Senhora, foram à Prefeitura (que ficava nos casarões do Valongo – atual Museu Pelé) cumprimentar o então prefeito Joaquim Montenegro, e participaram de um baile festivo no Parque Balneário Hotel, promovido pelos irmãos Fracarolli, proprietários do estabelecimento, considerado um dos mais luxuosos da América do Sul.
Enquanto oficiais, suboficiais e marinharia aproveitavam a estada no cais santista e os principais membros da comitiva subiram a Serra do Mar pela Estrada de Ferro para compromissos na capital, o povo santista e alguns visitantes de fora aproveitaram para conhecer por dentro a máquina de guerra italiana. O cais da Alfândega estava todo enfeitado com bandeirolas com as cores da Itália.
Em São Paulo
Durante todo o tempo em que esteve atracado em Santos, praticamente toda a tripulação do cruzador teve a oportunidade de viajar até a capital bandeirante e gozar das homenagens promovidas pela colônia italiana. O comandante Pini e seus oficiais mais próximos foram recebidos pessoalmente pelo presidente do Estado, Júlio Prestes, e ainda visitaram o Instituto Butantã, as Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo (IRFM), o Clube Espéria, o Parque Antárctica, a Estação da Luz e diversas entidades da colônia italiana na capital bandeirante.
Partida e destino
No dia 22, após seis dias atracado no cais do armazém 5, o Trento parte na direção de Montevideo, Uruguai, continuando sua missão diplomática. Em 1932, o Trento navegou em um cruzeiro para o Extremo Oriente. No início da 2ª Guerra Mundial, o navio participou da Batalha de Punta Stilo como o navio líder da 3ª Divisão do 2º Esquadrão. Em 12 de novembro de 1940, durante o ataque aéreo em Taranto (Itália), o cruzador foi atingido por uma bomba aérea britânica que acabou não explodindo. Em 27 de novembro de 1940, o Trento participou da Batalha do Cabo Teulada; e em 28 de março de 1941, na Batalha do Cabo Matapan. Em 8 de novembro daquele mesmo ano, o cruzador estava engajado na defesa fracassada do comboio de Duisburg. Em 22 de março de 1942, o navio participou da Batalha de Sirt. Em todas essas batalhas, Trento não infligiu nenhum dano a navios inimigos, nem sofreu danos a ele mesmo. Em 15 de junho de 1942, enquanto escoltava um comboio para o norte da África, o cruzador foi atingido por um torpedo de uma aeronave britânica e, em seguida, foi finalizado pelo submarino britânico, P-35.