Na galeria das personalidades mais marcantes da história do Brasil existe uma lista singularmente especial, a das mulheres ilustres que, além de se destacarem pelos seus atos pioneiros e extraordinários, evidenciaram-se dentro de um universo essencialmente dominado pelos homens, o que tornou ainda mais notável a conquista de cada uma delas.
Nesta lista de ouro da memória brasileira, podemos destacar, entre os vários nomes femininos, o de Anna Justina Ferreira Nery, mais conhecida como Anna Nery ou Ana Néri, nascida na cidade de Cachoeira (BA), em 13 de dezembro de 1814. Em 1837, ela casou-se com um militar da marinha, o capitão-de-fragata Isidoro Antônio Nery, quando adotou o sobrenome do marido que viria a consagrá-la como Anna Nery. Com ele teve três filhos: Justiniano, Antônio Pedro e Isidoro Antônio Nery Filho.
Anna ficou viúva em 1843, e teve de cuidar sozinha dos três filhos pequenos, criando um laço ainda mais forte com eles. Em 1864, quando irrompeu a Guerra do Paraguai, Justiniano e Antônio PEdro, já feitos oficiais do exército, foram para o campo de batalha acompanhados do tio, o Major Maurício Ferreira, irmão de Anna. Preocupada com os filhos, ela requereu, então, ao presidente da província da Bahia, o conselheiro Manuel Pinho de Sousa Dantas, que lhe fosse facultado acompanha-los durante os combates ou que ao menos pudesse prestar serviços nos hospitais do Rio Grande do Sul. Assim que o pedido foi deferido, Anna partiu de Salvador, incorporada ao décimo batalhão de voluntários, em agosto de 1865, na qualidade de enfermeira.
Durante toda a campanha, Anna Nery prestou serviços ininterruptos nos hospitais militares de Salto, Corrientes, Humaitá e Assunção, bem como nos hospitais da frente de operações. Numa deles, ela testemunhou a morte de um dos seus filhos, gravemente ferido na guerra. Terminado o conflito, Anna regressou à cidade natal, na Bahia, onde lhe foram prestadas grandes homenagens. O governo imperial ainda concedeu-lhe a Medalha Geral de Campanha e a Medalha Humanitária de primeira classe.
Anna morreu na cidade do Rio de Janeiro aos 66 anos, em 20 de maio de 1880. Em sua homenagem, no ano de 1923, a primeira escola oficial brasileira de enfermagem de alto padrão foi batizada com o nome de Anna Nery.
Em 1938, o então presidente Getúlio Vargas assinou o Decreto n.º 2.956, que instituía o “Dia do Enfermeiro”, a ser celebrado a 12 de maio, devendo nesta data ser prestadas homenagens especiais à memória de Anna Nery, em todos os hospitais e escolas de enfermagem do País. Em 2009, por intermédio da Lei n.º 12.105, de 2 de dezembro de 2009, Anna Justina Ferreira Nery entrou para o livro dos Heróis da Pátria, depositado no Panteão da Liberdade e da Democracia, em Brasília – Distrito Federal. Além das inúmeras homenagens que Anna Nery recebeu, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos lançou um selo comemorativo com o busto da enfermeira numa série de personalidades femininas com relevo histórico.
Filisbina Rosa
Como se pode notar, Anna Nery alcançou uma notoriedade extraordinária em razão dos seus feitos na Guerra do Paraguai. Porém, uma santista, que seguiu praticamente a mesma trajetória, não teve um reconhecimento semelhante. Esta santista atendia pelo nome de Filisbina Rosa.
Filisbina Rosa da Annunciação Fernandes e Silva nasceu em Santos em 1830. Com onze anos de idade, seguiu com os pais para o Rio de Janeiro, onde veio a se casar em 1846, com Joaquim P. de Andrade e Silva, de quem ficou viúva nove anos depois, com um filho pequeno para cuidar. Em fevereiro de 1865, este filho foi convocado para a campanha no Paraguai e, Filisbina, movida pelo amor à pátria e à saudade de seu único filho, resolveu oferecer ao Império os seus préstimos como enfermeira, seguindo com as vantagens então concedidas às irmãs de caridade da Santa Casa de Misericórdia.
Estacionou Filisbina em Montevideu, no hospital ali fundado. Em abril de 1866 foi transferida para Corrientes, e ali serviu no hospital de Ávalos, destinado a praças. Ali prestou valorosos serviços a feridos de passagem do Paraná. Esteve em Tuiuti e regressou a Corrientes acompanhando os feridos no combate de 14 e 16 de julho. Em 31 de julho de 1866 faleceu repentinamente de congestão cerebral, com idade de 36 anos, consagrados inteiramente à pátria e à educação do filho, Joaquim Fernandes de Andrade e Silva, que continuou a serviço do Exército, alcançando o posto de general.