Algum tempo depois do “descobrimento” do Brasil, em abril de 1500, o Reino de Portugal financiou diversas expedições marítimas com o objetivo de ter uma ideia do tamanho das terras que estariam sob seu domínio, baseado no Tratado de Tordesilhas (1494), que dividiu o mundo em duas partes (uma para os lusitanos e outra para os castelhanos – Reino de Casteta). Outras viagens foram bancadas com dinheiro privado, notadamente do bolso de banqueiros e comerciantes de diferentes partes da Europa, que demonstravam claro interesse nos potenciais de exploração do novo mundo.
Destas expedições resultaram, além de informações preciosas sobre fauna, flora e gentio (população) local, vários documentos em forma de mapas (ou cartas), que oferecia a possibilidade de um retorno organizado às novas jornadas aventureiras e comerciais para as terras além Atlântico. Elaborados por hábeis cosmógrafos (de cosmografia – estudo das estrelas) e cartógrafos (de cartografia – estudo dos mapas), estes primeiros mapas foram determinantes para o reconhecimento do litoral brasileiro, primeiramente de modo mais geral e amplo, depois, com o tempo, de modo mais sutil e detalhado.
Os primeiros mapas que incluíram a costa do Brasil para o conhecimento do mundo ocidental surgiram já em 1500 (Mapa Mundi de Juan de La Costa). Nos anos seguintes seriam produzidos outras dezenas de cartas, elaboradas por cientistas e artistas florentinos, alemães, holandeses, espanhóis e portugueses. Estas, até a primeira metade do século XVI, ainda se concentravam nos aspectos gerais, sem detalhamento de trechos da costa, até que, em 1574, o cartógrafo lusitano Luis Teixeira, velho colaborador de Abraham Ortelius (considerado o primeiro criador de um Atlas nos moldes modernos) mudou essa escrita ao produzir o trabalho intitulado “Roteiro de todos os sinais, conhecimentos, fundos, baixos, alturas, e derrotas que há na costa do Brasil desde o cabo de Santo Agostinho até ao estreito de Fernão de Magalhães”, cujo original se encontra na Biblioteca Nacional da Ajuda, em Lisboa, descoberto em 1909 pelo pesquisador Norival Soares de Freitas, membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Este compêndio de informações sobre o litoral sulamericano, do lado atlântico, possui diversas cartas específicas, com trechos importantes da costa brasileira. E é numa de suas páginas que se encontra um dos mais antigos mapas da região que compreende a cidade de Santos (até então vila, já fundada quase trinta anos antes – 1546).
De Bertioga a Itanhaém
No mapa de Luis Teixeira, a área abrangida vai da atual Bertioga até Itanhaém (ou Vila de Nossa Senhora da Conceição). Há apontamentos das fazendas que existiam na região em meados do século XVI, de alguns rios (Santo Antonio, da Trindade), das fortificações existentes (São Thiago e São Felipe, na defesa do Canal de Bertioga; e do forte de Itapema) e das quatro principais vilas locais (São Vicente, Porto de Santos – Santos, Nossa Senhora da Conceição – Itanhaém e Santo Amaro – Guarujá).
Uma curiosidade é que Teixeira chamou a região de Sam Vicete, o que não parece um erro de entendimento, uma vez que na anotação sobre a localização da vila, a palavra está grafada corretamente (São Vicente).
Quem foi Luis Teixeira?
Cartógrafo português, foi um dos colaboradores de Abraham Ortelius no Theatrum Orbis Terrarum. A atividade cartográfica há muito tempo esteve presente em sua família, a partir de meados do século XVI, quando seu pai, Pero Fernandes, começou a produzir mapas para a Coroa lusitana, tanto da costa africana, como outras cartas européias. Além do pai, também atuaram neste segmento, o irmão, Domingos Teixeira e, mais tarde, seus filhos, João Teixeira Albernaz (que também produziu um importante trabalho cartográfico sobre a Ilha de São Vicente, em 1631) e Pedro Teixeira Albernaz.
Uma de suas obras mais famosas é justamente o “Roteiro de todos os sinais, conhecimentos, fundos, baixos, alturas, e derrotas que há na costa do Brasil desde o cabo de Santo Agostinho até ao estreito de Fernão de Magalhães”, que reúne, além do mapa das “Capitanias hereditárias” (1574), trechos detalhados de vários pontos do litoral, como Itamaracá, Ilhéus, Porto Seguro, Rio de Janeiro e São Vicente. Uma curiosidade desta obra é notar que a linha do Tratado de Tordesilhas encontra-se deslocada dez graus para oeste, o que alguns historiadores acreditam que tenha sido proposital.