Ignorando os perigos que corria, Teró saltou nas águas do canal do porto para salvar um guarda da Alfândega da cidade
Santos, domingo, 30 de junho de 1912. Porto de Santos, 6 horas da manhã. O japonês Omi Teró andava pela beira do cais com um companheiro, a caminho do Valongo (onde um trabalho o esperava), quando percebeu um movimento estranho no convés de popa do paquete alemão “Erlanger”. Um homem, sem motivo plausível e aparente, saltara ao mar, mergulhando pesadamente nas escuras águas da Bacia das Docas. Diante do impacto, Teró sabia que ele não teria forças para nadar e, fatalmente, se afogaria. Sem pestanejar, o japonês tirou os sapatos e mergulhou, com a roupa do corpo, no intuito de salvar o estranho. Com alguma dificuldade, apesar do homem estar quase desfalecido, Omi Teró conseguiu conduzi-lo à salvo até a beira do cais, sendo ajudado ali por seu companheiro e alguns poucos trabalhadores que transitavam naquele momento nas proximidades do setor de desembarque de navios de passageiros, situado nos arredores da Alfândega.
O homem que caíra no mar era o guarda-moria Eduardo Pinto de Moraes (guarda-moria era uma espécie de polícia fiscal, cargo vinculado à Alfândega). Demonstrando estar bastante confuso, ele não conseguiu explicar o que havia acontecido. Por vias das dúvidas, o guarda-mor José Lobo Viana e o inspetor da Alfândega, coronel Maia Filho, enviaram um grupo de investigadores até o paquete alemão para checar o ocorrido. De qualquer forma, o gesto de Teró ficou registrado, com imensa gratidão, por toda a corporação fiscal. Afinal, ele arriscou sua própria vida para salvar a de uma pessoa que ele nem conhecia.
Em gratidão ao gesto nobre do japonês, a Sociedade Beneficente Mútua da Corporação dos Guardas da Alfândega de Santos promoveu no dia 7 de setembro uma solenidade para entregar uma medalha de ouro ao seu novo herói. Foi um evento completo. Ao meio-dia, por ordem do guarda-mor José Lobo Viana, todo o pessoal que estava de folga compareceu à repartição. O coronel Maia Filho fez a revista dos funcionários. Terminada a revista, foram todos para a Praça da República, onde o fotógrafo Marques Pereira tirou diversas chapas. Em seguida, no Salão da sociedade, teve lugar a cerimônia de entrega da medalha, que tinha a seguinte dedicatória: “Tributo de gratidão dos guardas da Alfândega de Santos ao benemérito Omi Teró, por haver salvado o guarda E. Pinto, 30/6/912”. No verso da medalha lia-se a seguinte inscrição: “Amor e Fraternidade”.
O terceiro escriturário, Arnaldo Damaso, em nome do inspetor, pronunciou um brilhante discurso, salientando o belo movimento da corporação dos guardas, dando esta prova de gratidão ao humilde trabalhador, que no cumprimento de um dever de humanidade salvou o guarda Eduardo Pinto de Morais.
Usou da palavra em seguida, o coronel Maia Filho que, num belo discurso, disse que materializaria o grandioso sentimento de fraternidade humana, que não conhece raças nem posições, pregando no peito do japonês Omi Teró a medalha que ele oferecia a classe de quem é o chefe supremo. Suas últimas palavras foram recebidas com uma prolongada salva de palmas.
O reverendíssimo Cônego Martins Ladeira, vigário da paróquia da cidade, encaminhou mensagem para reverenciar o assunto. “O sr. Omi Teró, num movimento de humanidade, esquecera do perigo que corria a sua vida para salvar do mar a vida de um seu semelhante. Elogiando a homenagem que se presta ao heroico japonês, digno de todas as considerações, faço votos pela constante prosperidade da Ilustrada agremiação.
O evento contou com mais de 200 pessoas entre representantes de instituições diversas e membros da imprensa, da capital e de Santos.