Entre os anos 1950 e 1960, as aparições do “Bom Velhinho”, em Santos, não se limitavam a acenos, fotografias e atendimentos aos pedidos das crianças numa confortável poltrona. Naqueles anos, Papai Noel chegava em Santos literalmente pelos ares e caia nos braços do povo, em cenas apoteóticas.
Milhares de pessoas lotavam quase todas as cercanias do coração do efervescente bairro do Gonzaga, inclusive extensa faixa de areia que se media desde o canal três até as proximidades do Hotel Praia Palace. Os olhos do povo, em especial das crianças, se voltavam para o céu, ansiosos, aguardando, naquela manhã de 17 de dezembro de 1961, a figura mais emblemática do imaginário popular natalino, o personagem que, nos oito anos anteriores, se fez presente, de forma regular, com a alegria e o vigor necessários para o cumprimento da nobre tarefa de abençoar o final de mais um ciclo temporal na vida de cada um daqueles seus admiradores.
A municipalidade de Santos tinha decidido, em 1955, adotar em seu calendário natalino a figura do Papai Noel Oficial, numa ação engendrada pelo Conselho Municipal de Turismo, com claros objetivos de incrementar as atrações locais ao público visitante (turistas e veranistas), abarcando na esteira a população fixa. E, desde o princípio, a ideia era potencializar o espetáculo, tornando o personagem, que por si só já carregava uma aura extremamente célebre, numa autêntica estrela pop (popstar).
O ponto chave era a chegada. Nada de aparecer em caminhão aberto do Corpo de Bombeiros ou em carros luxuosos e confortáveis. O “Bom Velhinho” tinha que desembarcar em Santos da maneira como as crianças aprendiam nas histórias contadas por seus pais e avós: pelo céu. Mas, pera lá!? De trenó e renas mágicas voadoras? De fato, era o que muita gente contava para os filhos menores, alargando ainda mais o entusiasmo infantil dos pequenos santistas. Porém, o Papai Noel praiano era mais intrépido e moderno, pois ele usou inicialmente como transporte aviões monomotores da Base Aérea de Santos.
Aviões e Helicóptero
No primeiro ano da ação, em 1955, um erro estratégico impediu a surpresa aérea. Havia tanta gente aguardando o herói natalino nas areias da praia do Gonzaga, que ficou impossível encontrar um espaço para o pouso. Após muita discussão, decidiu-se pela chegada terrestre. No ano seguinte, fora o mau tempo o destruidor dos planos. Mas, em 1957, Papai Noel finalmente pode potencializar sua aparição. Diante da demarcação de pouso devidamente protegida nas areias do Gonzaga, milhares de crianças fizeram enorme algazarra quando, às 9h50 do dia 15 de dezembro daquele ano, o avião noelino despontou na direção sul , pousando tranquilamente dez minutos depois. A emoção tomou conta de todos e a festa apoteótica tomou conta da cidade, sem hora para acabar.
Nos três anos seguintes, o ritual seguiu o script perfeito. O embarque acontecia na base aérea, num monomotor, que fazia algumas evoluções sobre o céu da cidade antes de pousar na pista oficial situada nas areias do Gonzaga. Ali, o “Bom Velhinho” era recepcionado por um séquito que o conduzia para uma série de atividades oficiais, que incluía um desfile pela orla da praia (em cima dos mais variados tipos de carro alegóricos), o recebimento da “Chave da Cidade”, pelas mãos do prefeito ou algum representante e, finalmente, o atendimento às crianças que, aos milhares, se encantavam com o intrépido Noel “popstar”.
Em 1961, o Conselho Municipal de Turismo resolveu inovar. A criançada se encantava com a oportunidade de ver de perto os aviões noelinos, mas, com certeza, ficaria ainda mais fascinada se o Papai Noel chegasse a Santos em outro tipo de veículo aéreo: o helicóptero. E assim foi.
Com uma aeronave especial da Força Aérea Brasileira, o “Bom Velhinho” sobrevoou toda a orla santista, acenando com mais facilidade para o povo lá embaixo. Eram 10 horas da manhã do dia 17 de dezembro, quando o helicóptero pousou mansamente nas areias praianas do Gonzaga. Centenas de pessoas invadiram a pista para recepciona-lo, tornando difícil sua caminhada até o palanque oficial, onde o prefeito José Gomes o aguardava com a Chave da Cidade. Fazendo uso do microfone, Papai Noel saudou os santistas com uma delicada mensagem e, na sequência, participou do grande desfile pela avenida Vicente de Carvalho, acompanhado de três bandas. A cidade ficou literalmente em festa.
De Papai Noel Oficial a Comercial
A ação da municipalidade só durou mais dois anos. Em 1963, o Papai Noel oficial se despedia. A partir do ano seguinte, e por algum tempo, a figura mágica do Natal seria adotada apenas por algumas entidades sociais. Nos anos 1970, até houve uma tentativa para resgatar a figura natalina oficial, com direto inclusive à grande chegada de helicóptero. Mas isso não vingou por muito tempo. O comércio, enfim, assumiu a contratação noelina, como é até nos dias de hoje.