Há 60 anos, TV Santos era inaugurada como a sétima emissora brasileira, a primeira fora de capital
Dia 29 de novembro de 2017, a história da TV brasileira mais uma vez virou a página, com a extinção do sinal analógico e a consequente consolidação do sistema digital no país. Em Santos, os primeiros passos na direção da qualidade em alta definição de imagem (ou HD – High Definition) já tinham sido dados há alguns anos, mais especificamente em março de 2009, quando do início das transmissões pelo novo modelo através da TV Tribuna, o que tornou a afiliada da Rede Globo na Baixada Santista, criada em 1992, a terceira emissora situada fora de capitais a implantar a novidade.
Participar de protagonismos na área televisiva, assim, e apesar de muita gente desconhecer, é algo que já faz parte da história santista no segmento. A começar pela própria chegada da TV ao Brasil, em março de 1950, tendo como porta de entrada o Porto de Santos. Por aqui passaram os primeiros equipamentos televisivos do país (câmeras, suítes, luzes de estúdio e toda a parafernália necessária para fazer funcionar uma emissora), adquiridos junto à norte-americana RCA (Radio Corporation of America). O desembarque das peças foi um verdadeiro acontecimento, estando presentes figuras que se destacariam no cenário do novo meio de comunicação, como Lolita Rodrigues, Yara Lins, Cassiano Gabus Mendes, Hebe Camargo e Lima Duarte, todos grandes artistas do rádio. E, entre eles, o mais importante personagem da gênese televisiva brasileira, o empresário paraibano Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello, na época já dono da maior rede de comunicação do país – Os Diários Associados.
Uma TV santista
Testemunhas oculares daquele momento especial, os santistas assistiram o nascimento da TV Tupi, instalada na capital paulista em 18 de setembro de 1950. A novidade tecnológica empolgou outros empresários que, a exemplo de Chateaubriand, se lançaram à aventura da televisão. Assim, aos poucos, e sucessivamente, iam surgindo outras emissoras, todas concentradas no Rio e em São Paulo: (Tupi SP – canal 3 – 1950 / Tupi RJ – canal 6 – 1951 / TV Paulista – SP – canal 5 – 1952 / TV Record SP – canal 7 – 1953 / TV Rio RJ – canal 13 – 1955). A capital mineira, Belo Horizonte, foi a primeira a quebrar a dobradinha SP-RJ, instalando, em 1955 a TV Itacolomi, com conteúdo local, livre da influência paulista/carioca.
Depois dela, somente em 1957 é que surgiria outra emissora dona de uma programação exclusivamente regional. E esta cidade seria Santos.
Vendo passar diante do próprio nariz toda a tecnologia necessária para colocar no ar uma estação de TV, os santistas ousaram propor ao então dono da TV Paulista, o radialista e empresário Victor Petraglia Geraldini, mais conhecido como Victor Costa, que montasse na cidade uma subestação de sua emissora, com promessas de lucratividade, dado o perfil comercial da cidade. Convencido de que poderia ser uma boa ideia, o empresário paulistano abriu o bolso e viabilizou a montagem da TV Santos, anunciada como a primeira emissora televisiva regional (considerando-se que não se tratava de capital de Estado).
Até então, a Baixada Santista só dispunha da programação oriunda da capital paulista, e nem sempre com boa qualidade visual. Os sinais das TVs Tupi, Paulista e Record chegavam de forma precária aos cerca de quatro mil televisores que existiam em Santos em fins da década de 1950 (segundo censo realizado na época). E ainda assim porque os retransmissores instalados na Serra do Mar, em 1957, contribuiam bastante nesta viagem invisível. De lá, o sinal televisivo rebatia num conjunto de antenas de captação de alta frequência (VHF – Very High Frequency) montado em torres retransmissoras instaladas no alto do Monte Serrat e na Ilha Porchat. Naqueles primeiros anos era praticamente nula a existência de sinais em frequência ultra-alta (UHF – Ultra High Frequency). As que chegavam, eram rebatidas em uma torre retransmissora instalada no Morro do Tejereba, Guarujá.
Equipamentos da casa
Depois de tudo afinado entre os santistas e as Organizações Victor Costa, finalmente, em 15 de novembro de 1957, a cidade de Santos dava um importante passo para a política de descentralização de transmissões televisivas no Brasil. E com um adendo. Ao contrários das grandes das capitais, a emissora local não fazia uso de equipamentos importados, mas fabricados no município praiano por empresários que instituiram a Rebratel, uma organização que tinha como objetivo criar uma rede nacional de televisão a partir de Santos. Para se ter uma ideia do impacto da Rebratel no segmento, é importante ressaltar que foi esta empresa santista a primeira do Brasil a produzir antenas parabólicas, além de aparelhos receptores para circuitos fechados.
Com o importante suporte, a inauguração da emissora santista, que contava com a parceria da Rádio Clube de Santos, constituiu-se em um dos grandes acontecimentos da cidade, reunindo autoridades políticas, culturais, esportivas e empresariais de todo o Estado de São Paulo. Os primeiros programas foram gravados nos estúdios da própria estação radiofônica santista, que ficava na rua José Cabalero, Gonzaga. Entre as atrações, destacava-se o Discopa Musical, patrocinado pela principal loja de aparelhos eletrodomésticos da cidade.
Rádio com imagem
A TV Santos trabalhava, conceitualmente, tal qual às outras emissoras brasileiras da época, ou seja, como uma dinâmica e linguagem típica do rádio, porém com imagens. Sem contar ainda com a tecnologia do “vídeo tape” (gravação), a programação local era totalmente gerada ao vivo, iniciando pela manhã e prosseguindo até o meio da tarde. Dali em diante, retransmitia os programas da TV Paulista. A TV Santos chegou a receber muitos convidados especiais, em parceria com a Rádio Clube. Um deles se tornou um dos ícones da TV brasileira: a apresentadora Hebe Camargo, na época conhecida como a “Estrela de São Paulo”. Sua estreia na TV Santos ocorreu na véspera do Ano Novo, em 31 de dezembro de 1957.
A emissora santista promoveu muita gente para o estrelato, como a apresentadora de culinária Ofélia Anunciato (1924-1998). Ela iniciou sua carreira nos palcos da Rua José Cabalero. Outros programas que marcaram a história da emissora foram o Cinema de Bolso, Telenotícias Discopa, Discopa Informa, Solos e Solistas, Show Panex com Chocolate, Vozes da OVC e O Café do Felisberto.
Fim prematuro
Mesmo tendo realizado coisas inusitadas para a TV brasileira, a emissora santista, pioneira, não justificou comercialmente sua viabilidade e acabou encerrando as atividades de forma precoce, pouco mais de um ano após ter iniciado suas operações. Há quem diga que ocorrera uma ruptura de relações entre a Rebratel e as Organizações Victor Costa. Os donos da TV Paulista permaneciam mais preocupados em expandir suas ações na capital, tanto que, três anos depois, eles viriam a fundar a TV Excelsior, emissora que rapidamente se tornaria uma das maiores do país.
Com o fim da TV Santos, o canal 5 local voltou apenas a transmitir a programação de São Paulo. Isso pode ser constatado pelo que era publicado diariamente no jornal A Tribuna. A concessão do canal local, mesmo sem estar em operação, foi preservada até 1975, quando um decreto governamental a revogou.
Os santistas, a partir da extinção da TV Santos, amargaram mais de trinta anos sem emissoras locais, até que surgiria, no início dos anos 1990, por concessões, uma safra de estações televisivas que até hoje enriquecem a telinha santista oferecendo uma programação vinculada à realidade e ao cotidiano da Baixada Santista.