Santos, Porto do Café… e da Banana

Plantação de Banana nos arredores de Santos no começo do Século 20.
Plantação de Banana nos arredores de Santos no começo do Século 20.

Ao longo de seus mais de 470 anos de história, Santos viveu importantes ciclos econômicos que, de muitas formas, contribuíram para a transformação das características demográficas, urbanas e até culturais da região. Foi assim com o ciclo da cana-de-açúcar, durante o período colonial; e o ciclo do café, iniciado nas primeiras décadas do século 19. Além desses, desde os primeiros tempos da ocupação colonizadora até meados do século 20, outras atividades econômicas, coadjuvantes, geraram grandes impactos à vida santista, como o comércio do sal (a partir de 1631); do ouro (curto período no final do século 17); e da banana (do início do século 19).

Sobre este último, a mais antiga menção é de março de 1837 (180 anos), de acordo com estudos realizados pelos pesquisadores Cesar Cunha Ferreira, Francisco Rodrigues Torres e Welington Ribeiro Borges entre 2008 e 2009, que culminou na edição de um livro sobre a história de Cubatão, sítio historicamente reconhecido como “zona agrícola” santista (antes de se tornar um pólo petroquímico-siderúrgico).

Naquela primeira metade do século 19, o futuro distrito pé de serra começou a ganhar áreas inteiras dedicadas ao cultivo da fruta tropical, que logo se tornaria a mais significativa força econômica tipicamente caiçara e a segunda, geral, no Porto de Santos (suplantada apenas pelo ouro verde brasileiro, o café, responsável por colocar o país num patamar de destaque no cenário comercial internacional).

Os Reis da Banana

Durante sua época áurea (entre 1870 e 1930), o “ouro verde” produziu figuras oligárquicas de grande poder econômico, os chamados “Barões do Café”, assim como influentes comerciantes que enriqueceram em torno do principal produto brasileiro. No campo da banana, por outro lado, a coisa não foi tão aristocrática assim, ao menos do ponto de vista da influência política. Os grandes bananicultores se comportavam de maneira muito mais discreta e simplista, porém protagonizando enormes gestos de solidariedade, como foi o caso de João Octávio dos Santos (filho bastardo de João Octávio Nébias – irmão do famoso Conselheiro Nébias – com sua escrava, Escholástica Rosa de Oliveira) que, com a fortuna amealhada através do comércio da banana, mandou construir o Instituto Escholástica Rosa, com o objetivo de oferecer educação técnica gratuita aos jovens de baixa renda da cidade.

Casa caiçara ao lado de bananal, início do século 20.
Casa caiçara ao lado de bananal, início do século 20.

O gesto de Octávio acabou repetido por outros membros da “nobreza” da banana, como o português Adriano Dias dos Santos, patrono da “Cidade da Criança”, construída na Praia Grande, além de outras obras de cunho assistencialista; e a espanhola Áurea Gonzalez Conde, que ficou conhecida como “A Rainha da Banana”, em razão do seu pioneirismo em relação à exportação da fruta no Brasil e pela pujança que alcançou neste segmento, chegando a manter no seu patrimônio dois navios para o transporte exclusivo da sua produção ao mercado sulamericano. Dona Áurea Conde, entre diversas ações, liderou a criação da Cooperativa Central dos Bananicutores do Estado de São Paulo, que se tornou a mais alta expressão do gênero, respondendo por 60% da exportação brasileira de banana.  Na década de 1940, ela já era tida como a maior exportadora da fruta no país. A principal lembrança que a Rainha da Banana deixou em Santos, por muitos anos, foi a sua imponente residência situada em plena Praça da Independência, um dos maiores e mais vistosos palacetes da cidade, referência por muitos anos no bairro, mas hoje totalmente desaparecido.

Porto da Banana

Embarque de banana no Porto de Santos nos anos 1950. Para proteger os cachos, eram utilizadas fibras de bananeira.
Embarque de banana no Porto de Santos nos anos 1950. Para proteger os cachos, eram utilizadas fibras de bananeira.

O volume da atividade bananeira na cidade fez com que o cais santista chegasse a ser reconhecido, nacionalmente, a partir dos primeiros anos da década de 1910, como o “Porto das Bananas”. Nesta época a fruta tropical ocupava o posto de segundo produto mais ativo na escala de embarque, ficando atrás somente do café. O curioso é que, ao contrários dos valiosos grãos verdes, que embarcavam pelo lado seco do porto, nas costas de milhares de estivadores, as cargas de bananas chegavam até os navios pelo lado contrário, no lagamar estuarino, levadas em grandes “chatas”.  Elas enconstavam nos cascos das embarcações, onde eram presos os cachos de bananas em cabos puxados por pequenos guindastes.

Com o avanço do porto santista para os lados do Paquetá e a surgimento do Mercado Municipal, uma das cenas mais comuns era o intenso movimento dos vendedores de banana, em especial pequenos produtores caiçaras, no entorno da bacia, repleta de barcos carregados de cachos verdes. Os principais destinos da fruta brasileira eram a Alemanha, a Argentina e o Uruguai.

Doce de Banana

Com tanta fruta disponivel por aqui, em paralelo ao comércio in natura, surgiram diversos empreendimentos que passaram a processar a banana de diversas formas: desidratada, em compotas, cristalizada, caramelizada e outros meios de prolongamento da vida útil do alimento. Entre as empresas que mais se destacaram neste segmento, podemos citar a firma “A Leoneza”, fundada em 1904 pela família Flores. Na sua sede, localizada na rua da Constituição, Vila Mathias, eram produzidos os doces “Banana Santista”, “Banana Marrom com Estanhola”, “Bombom de Banana” , além de caramelos e balas. Grande parte desta produção ganhou o mundo e levou o nome de Santos a vários mercados, especialmente europeus.

Origem do nome
Há quem diga que o nome “Leoneza” fora dado como uma referência ao país africano “Serra Leoa”, onde reputa-se a origem da palavra “banana”. Porém, alguns historiadores e pesquisadores afirmam que o nome relaciona-se à cidade de León (ou Leão, Espanha), de onde teria vindo a família Flores, proprietária da famosa fábrica de doces. Os defensores da primeira tese refutam a origem dos Flores na velha cidade dos antigos reis católicos, afirmando que eles seriam, na verdade, da pequena vila de Goian, situada na fronteira com Portugal, nas margens do Rio Minho.

A banana

De origem asiática, a banana é mencionada em escritas datadas por volta de 600 a.C. Os árabes a levaram para a África em cerca de 700 d.C., onde os portugueses a encontraram em 1402. Logo propagaram seu cultivo nas Ilhas Canárias e a partir de 1516, a espalharam pelo Caribe e América do Sul. As primeiras mudas trazidas ao Brasil vieram justamente das Ilhas Canárias e Serra Leoa. Porém, a banana sempre foi um produto de consumo local. Só começou a ser comercializado internacionalmente no final do século 19, graças aos avanços dos sistemas de refrigeração. Hoje, a Índia lidera a produção de banana no ranking mundial, sendo responsável por 28,1%. A China, com 10,1%, vem em segundo lugar, seguida pelas Filipinas, com 8,6%; Equador, com 7%; Brasil, com 6,9%; e Indonésia, com 5,8%.

Os cartões postais da época retratavam a economia regional.
Os cartões postais da época retratavam a economia regional.
Na Bacia do Mercado, os produtores de banana vendiam seus produtos para o mercado interno.
Na Bacia do Mercado, os produtores de banana vendiam seus produtos para o mercado interno.
O Instituto Escolástica Rosa foi construído com o dinheiro da banana.
O Instituto Escolástica Rosa foi construído com o dinheiro da banana.
Na Praça da Independência ficava o palacete da Rainha da Banana, Dona Áurea Conde.
Na Praça da Independência ficava o palacete da Rainha da Banana, Dona Áurea Conde.

 

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