Fenômeno geológico atraiu centenas de pessoas ao recém-criado bairro da Vila Macuco. Linhas de bonde e de barcos foram colocadas à disposição para atender a demanda de curiosos, que vinham até da capital para assistir de perto as tais erupções “vulcânicas”
Vila Macuco, Santos, 28 de dezembro de 1896. Eram quase 13 horas quando operários da Comissão de Saneamento de Santos, trabalhando na implantação de um complexo sistema de esgoto no bairro operário da Vila Macuco, se depararam a uma estranha situação. Depois de introduzirem um tubo de 17 metros no solo do Varjão dos Outeirinhos, para o assentamento de máquinas que teriam a missão de acomodar malhas de concreto na rede local, uma forte corrente de ar frio rompeu pela tubulação, assustando a todos.
O chefe do serviço, diante da situação, suspendei os trabalhos e logo reportou o ocorrido aos superiores. Horas se passaram sem que o ar frio não cessasse de escapar, fato que varou a noite num ritmo bastante sinistro.
Por volta das 6 horas da manhã do dia 29, a corrente de ar se intensificou de tal maneira, que um forte zumbido se fez ouvir, seguido de apitos que emanavam ora som grave, ora agudo, em intensidades intercaladas de força.
Enquanto todos se perguntavam o que estaria acontecendo e buscavam respostas para o fato, às 7h30 o ar frio expelido pelo cano passou a ser acompanhado de uma espécie de água arroxeada, expelida com bastante intensidade pelo mesmo tubo.
Causando espanto a todos, a estranha mistura se inflamou e começou a produzir uma chama de cor amarela, ao mesmo tempo em que alguns pedaços de lodo róseo petrificados começaram a cair no entorno daquele espécie de gêiser.
Os técnicos da Comissão de Saneamento, então, colheram um pouco da água, depositando-a numa garrafa. Intrigados com o fenômeno, avaliaram que, apesar de apresentar cor arroxeada, a mostra de lodo não retinha depósito de partículas que lhe justificasse a tonalidade.
Com o passar das horas, as labaredas se intensificaram em densidade e tamanho. O fato quebrou a rotina da pacata cidade santista, que observava atônita a coluna de fumaça que vinha do lado dos Outeirinhos. Um incêndio? Nada disso! Um vulcão entrou em erupção em Santos! Esse era o tom das notícias que corriam pelas ruas do centro.
O fenômeno atraiu os santistas mais corajosos, que rumaram às pressas para o Macuco. Os donos da empresa de transporte Viação Paulista, percebendo um filão de ganho, logo disponibilizaram linhas extras de bonde para o local do “acidente natural”. Como noticiou os jornais da época, “todos foram para aquela zona, e lá se iam ramerrando pela avenida acima, apinhados de gente até a tolda, como nos grandes dias do entrudo no coração da cidade. Foi uma procissão. Todos queriam contemplar o ineditismo do espetáculo”
De fato, o fenômeno era digno de ser visto.
Por outro lado, o caso suscitou toda sorte de reações. Os religiosos mais fervorosos rezavam para que as chamas não se propagasse para a cidade. Os mais radicais já anunciavam o juízo final, os céticos riam e divertiam-se com as opiniões tensas alheias, assim como da cada vez mais intensa curiosidade, que tomava conta da alma dos jovens santistas.
Muita gente foi à pé até os confins do Outeirinho só para ver de perto o temível vulcão a cuspir sua “lava incandescente”. Assim, além dos empresários dos bondes, houve os que se aproveitaram para faturar algum com a venda de amendoim, bolinhos de fubá, pamonhas, mungunzá, doçarias, limonada e pasteizinhos quentes, tornando o caminho até a atração uma espécie de corredor gastronômico da época.
A notícia se espalhou pela região, subiu a Serra do Mar, alcançou a capital e depois o interior. Todos os dias descia gente pelos trens da São Paulo Railway para ver de perto a atração turística, aliás a primeira que se tem notícia na história de Santos.
Por conta do fluxo de curiosos, somou-se à venda de comes e bebes e o transporte de bondes, o serviço de transporte marítimo. Isso mesmo! Os “turistas” que desembarcavam no Valongo para conhecer o “Vulcão de Santos” podiam fazer uso de botes e catraias para chegar ao local através do canal do estuário. Os pontos de saída eram diversos: no Valongo, Alfândega e no Paquetá, onde havia o Mercado das Canoas.
Por mais de um mês o “vulcão” ficou ativo, queimando toneladas de gás natural, do bolsão que fora perfurado pelos homens da Companhia de Saneamento. Até o dia 31 de dezembro, mais de 8 mil pessoas já haviam contemplado o espetáculo, a maior queima já registrada na cidade. O fogo só extinguiu em janeiro de 1897.
Hoje, sobre o lugar onde existiu o Vulcão do Macuco, estão construídas casas e imóveis industriais.