Zoom: Quando a Noite Virou Espetáculo

Inaugurada em 1985 por Chico Recarey, a Discoteca Zoom marcou gerações com luxo, luzes, música e liberdade — tornando-se o grande templo da diversão santista até meados dos anos 1990.

Santos, 21 de novembro de 1985. A cidade parecia respirar um ar diferente naquela quinta-feira. As vitrines do Gonzaga cintilavam, os táxis se apressavam pela Ana Costa e, ao cair da noite, um movimento elegante se formava em frente ao antigo Teatro Independência, no coração do Gonzaga. Era a inauguração da Discoteca Zoom, o novo símbolo de uma Santos que aprendia a dançar ao ritmo frenético dos anos 1980. Aquele endereço, outrora destinado a dramas e comédias teatrais, renascia como um templo do hedonismo, envolto em luzes de néon, espelhos, fumaça e glamour.

O anfitrião era o lendário Chico Recarey, espanhol de fala apressada e gestos teatrais, conhecido no Rio de Janeiro como o “rei da noite”. Seu império de boates — o Scala, a Asa Branca, o Chico’s Bar — havia transformado o lazer carioca em espetáculo. Agora, pela primeira vez, ele cruzava a fronteira do Estado fluminense para inaugurar uma casa em São Paulo. E não seria qualquer uma: a Zoom era, segundo seus idealizadores, “A Discoteca de 1985”.

Cenas da Inauguração, com Chiquinho Scarpa, Miriam Guedes e Chico Recarey (primeira foto); Clodovil e Rubinho Souza (os dois da direita, na foto 2); Fulvio Stefanini (à esquerda, na foto 3) e uma turma animada da sociedade santista.

A noite em que Santos se vestiu de gala

Pouco depois das 21 horas, os convidados começaram a chegar. O famoso estilista Clodovil Hernandes, vestindo um blazer vermelho e camisa verde, chamava atenção com seu estilo ousado e inconfundível, distribuindo cumprimentos a todos; Chiquinho Scarpa, impecável em seu terno de linho, sorria para os flashes; Fúlvio Stefanini, então no auge da carreira televisiva, atravessava o tapete vermelho cumprimentando conhecidos; e Pelé, o Rei do Futebol, completava o time de estrelas que davam o tom da inauguração. A colunista social Thereza Bueno Wolf, de A Tribuna, cuidava dos detalhes da recepção, garantindo que cada personalidade tivesse seu lugar no brilho da festa.

Por fora, a Zoom já se impunha como promessa de modernidade. A entrada, revestida em magenta reluzente e molduras negras, destacava-se na paisagem da Ana Costa, atraindo os olhares de quem passava. Luzes douradas refletiam sobre o mármore e criavam um jogo cintilante entre o luxo e o mistério. Ali, diante da fachada, formavam-se filas de convidados trajados com esmero — ternos brancos, vestidos de tafetá e penteados exuberantes —, enquanto seguranças controlavam o acesso ao som abafado que escapava de dentro.

Ao atravessar aquele portal luminoso, os visitantes mergulhavam em um ambiente concebido para causar impacto. O hall de entrada, longe do convencional, assemelhava-se a uma antessala teatral, com paredes em tons vibrantes, pastilhas espelhadas e corrimãos de bronze que multiplicavam o brilho dos lustres e a expectativa de quem chegava. O jardim natural, criado pelo paisagista santista Oswaldo Casasco, suavizava o clima sofisticado.

Após a curta subida da escada de acesso, o visitante chegava ao mezanino, um espaço de imponência cênica: ali se estendia um bar de 26 metros de comprimento, ladeado por camarotes e mesas VIP para cerca de cem pessoas, de onde se podia observar toda a pista. Ao fundo, a cabine de som e iluminação reinava como centro de controle da noite. Dela, técnicos e DJs comandavam os raios laser importados, os mesmos que cintilavam nas lendárias madrugadas do Studio 54, em Nova Iorque, fazendo da Zoom um espetáculo de luz e movimento à altura das grandes casas do mundo.

Os ambientes da Zoom, em toda a sua atmosfera oitentista: a cabine do DJ com vista para a pista lotada; o bar iluminado; os assentos laterais com paredes revestidas de carpete estampado com serpentinas que desenhavam a palavra “Zoom”; e os disputados camarotes, todos forrados em rosa.

Quando o luxo encontrou o som

As duas pistas de dança eram o coração pulsante da Zoom. Uma de aço inoxidável, que refletia os movimentos do público, e outra de acrílico transparente, onde as luzes se projetavam em forma de estrelas de néon. Por toda a sala, arquibancadas em formato semicircular recebiam trezentas pessoas, criando um ambiente que misturava boate e arena. O som, de última geração, vinha direto dos Estados Unidos e fazia vibrar o chão em cada batida.

Os detalhes eram pensados para impressionar: o carpete personalizado em tom prateado, com a palavra “Zoom” entrelaçada em amarelo, azul, branco e vermelho — parecendo serpentinas. Nas mesas, drinques coloridos, taças geladas e garçons com uniformes de corte europeu. Tudo obedecia à estética de uma década que amava o brilho, o excesso e a tecnologia.

A entrada da Zoom, inteiramente revestida em rosa, já anunciava o clima vibrante da noite. Lá dentro, a pista ganhava vida com jogos de luzes coloridas, enquanto a cabine de som — equipada com toca-discos e vinis — comandava o ritmo que embalava a multidão.

O Grupo Recarey e o sonho de expansão

Alejandro Figueroa, braço direito de Chico Recarey e diretor do grupo, disse à época que a Zoom foi o primeiro passo de uma nova fase. e que a cidade deSantos merecia uma casa à altura das melhores do mundo. “Aqui, nada ficará atrás das discotecas da Europa ou dos Estados Unidos”, afirmava com orgulho. O projeto santista era também um teste para o futuro: o grupo planejava abrir, no ano seguinte, a boate Scalf, em São Paulo, e desejava sentir o pulso do público paulista antes de conquistar a capital.

Recarey, na época já era dono de 27 casas noturnas no Rio, havia construído um verdadeiro império do entretenimento. O segredo, dizia ele, era criar ambientes “finos, elegantes e democráticos”. E a Zoom seguia essa filosofia, voltada especialmente aos jovens entre 20 e 40 anos, que desejavam dançar sem hora para acabar.

Para a molecadinha, havia as matinês — tardes de pura euforia, quando a pista se enchia de crianças e adolescentes descobrindo seus primeiros passos de dança sob luzes coloridas, glitter por toda parte e aquele clima de liberdade que só a Zoom sabia oferecer.

O calendário da diversão

A Zoom abriria suas portas ao público no dia seguinte, 22 de novembro, prometendo noites intensas de quinta a domingo — e, a partir de 15 de dezembro, todos os dias. As matinês de domingo seriam uma novidade: crianças a partir de oito anos poderiam dançar ao som das mesmas músicas, mas com refrigerantes no lugar de drinques, num ambiente controlado e familiar.

Os ingressos seguiam a lógica dos tempos de inflação galopante: Cr$ 40 mil para homens e Cr$ 30 mil para mulheres nas quintas e sextas; Cr$ 60 mil e Cr$ 40 mil aos sábados; e preços populares aos domingos, Cr$ 15 mil nas matinês e Cr$ 25 mil à noite — sempre com direito a um drinque de cortesia. Eram valores altos, mas a promessa era clara: diversão e status em igual medida.

O templo da noite santista

A Discoteca Zoom tornou-se um verdadeiro símbolo da noite santista, traduzindo o espírito de uma geração que viveu intensamente entre meados dos anos 1980 e 1990. Foi uma casa noturna que se tornou um ponto de encontro, um palco de modas, sonhos e liberdades.

Em 1987, a cidade ganharia uma concorrente à altura, a Lofty, instalada no antigo Cassino Atlântico, mas a Zoom manteve seu reinado por uma década, embalando centenas de histórias de paixões, encontros fugazes e amizades improváveis. Quando finalmente encerrou suas atividades em 1996, deixou um vazio difícil de preencher.

Ainda hoje, quem viveu aqueles tempos recorda com brilho nos olhos as noites em que bastava dançar para ser feliz. Uma era sem celulares, sem internet, sem distrações digitais — apenas a música, a luz, os amigos e a pura alegria de viver a noite.