Sarah Bernhardt, atriz mais famosa da história, encena “A Dama das Camélias” no Teatro Guarany

Cartaz da Peça “A Dama das Camélias” da época em que a atriz francesa esteve no Brasil.

Era 4 de julho de 1886, um domingo. Os santistas mal podiam acreditar que a maior estrela teatral do planeta havia desembarcado na cidade. Sarah Bernhardt, a Rainha da Arte, a Estrela dos Palcos, musa acostumada à adoração de Paris e à admiração europeia, havia se dignado a viajar até àquele pequeno arrabalde longínquo do “mundo civilizado”. A “Divina”, como a chamavam seus milhares de fãs, pisara havia poucos dias pela primeira vez no país habitado, segundo seus conterrâneos, por um “povo de macacos”. No entanto, o que a pequena francesa encontrou, como diria mais tarde, foi um povo feliz e acolhedor, a começar por aquele que a recepcionou, Joaquim Nabuco, importante diplomata do Império, a quem Bernhardt se referia como “um homem perfumado e elegante”.

A atriz planejou uma pequena turnê, no Brasil e Argentina, da sua famosa peça “A Dama das Camélias”, baseada no romance do escritor francês Alexandre Dumas, publicado em 1848. Após chegar ao Rio de Janeiro em 26 de maio e se manter em cartaz por mais de um mês no Teatro Imperial São Pedro de Alcântara, Sarah rumou para São Paulo em 27 de junho, onde fez duas apresentações no Teatro São José. No domingo, dia 4 de julho, ela desceria a Serra do Mar para se apresentar no Teatro Guarany. Ela faria ainda outras duas apresentações na capital bandeirante e uma no Teatro São Carlos, em Campinas, antes de retornar ao Rio de Janeiro, de onde partiria em direção a Buenos Aires (Argentina).

Bernhardt chegou a Santos no começo da tarde. Fazia muito frio na cidade, um clima estranhamente incomum ao povo santista que, na chacota, chegou a enviar correspondências aos jornais pleiteando ao diretor da City (empresa que cuidava do transporte coletivo) que transformasse os bondes (ainda movidos a tração animal) em trenós. Piadas à parte, a notícia da chegada da “Divina Sarah” foi um tanto que modesta na imprensa local, a ponto de o resultado ser percebido na estação de trem do Valongo, onde a atriz francesa desembarcou vindo de São Paulo. Pouca gente estava lá para ver de perto uma das mulheres mais famosas de seu tempo.

A PEÇA NO GUARANY

À noite, o Teatro Guarany estava lotado para ver Sarah despejar a sua “voix d’or” sobre a plateia. Seu papel era de Margarida Gautier, uma jovem e bela cortesã requisitada pelos homens mais ricos da sociedade parisiense, que se apaixona por Armand Duval, estudante de Direito e único que realmente se importa com o seu bem estar. Os santistas ficaram hipnotizados pelo canto doce da atriz francesa, nesta opereta consagrada mundialmente. E Sarah ficou encantada com a arquitetura do teatro, que ainda cheirava a novo (o Guarany havia sido inaugurado em 1882), chamando-o de elegante e de bom gosto.

Do outro lado, o gosto do público pelo espetáculo foi menos intenso. De acordo com o “Indicador Santista para 1887”, revista que publicava os principais acontecimentos do ano anterior, “os pais de família da cidade, durante o espetáculo, sentindo – pelo olfato – uma ou outra imoralidade da peça envolta na impermeável capa do francês, davam Graças à Deus de não ser dito em vernáculo (português) aquilo que suas filhas ouviam, sem compreender, felizmente”. Realmente a peça não era para os conservadores natos.

ASSALTOS E GATUNOS

Os preços para ver Sarah no palco do Guarany estava um verdadeiro “assalto”. Camarotes custavam 70$000 (Setenta Mil Reis), o equivalente hoje a cerca de R$ 600, cadeiras e varandas a 15$000 (cerca de R$ 200) e galerias a 4$000 (cerca de R$ 50). Ainda assim, foram mais em conta do que em Campinas, onde o camarote foi vendido a 160$000 e a cadeira a 30$000.

Outro tipo de assalto foi sentido entre os espectadores de Santos. Após o término do espetáculo, várias pessoas foram dar queixa à polícia por terem suas carteiras furtadas.

Sara Bernhardt, em foto postal de 1891
Sara Bernhardt, em foto postal de 1891

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