Atleta Náutico foi inspirado em superatleta santista

Estátua que simboliza a força dos esportes aquáticos na cidade teve como modelo Adalberto Mariani, um atleta absolutamente completo.

Santos, terça-feira, 27 de março de 1945. O escultor ítalo-brasileiro Caetano Fraccaroli rabiscava o papel sem praticamente piscar os olhos, traçando com um pedaço de carvão cada detalhe das linhas e contornos de seu modelo vivo. A obra que lhe fora encomendada pelo então prefeito, Antônio Gomide Ribeiro dos Santos, tinha de ser perfeita, porque representava um símbolo de orgulho para a cidade santista desde as décadas finais do século 19: o atleta náutico. E, para não correr riscos desnecessários na composição física de seu personagem, o escultor “convocou” aquele que era considerado entre os atletas da cidade como o “desportista completo”, o mais badalado de Santos. Remador, nadador, saltador de trampolins, jogador de basquete e de polo aquático, Adalberto Mariani, do Clube de Regatas Vasco da Gama, era o modelo ideal para a obra, não só por ser admirado por todos, e temido pelos adversários, como por também ser visto como uma espécie de “Johnny Weissmuller” * santista.

De fato, a obra ficou, ao final, impecável. O monumento, de cinco metros de altura total, reservara só para a figura do atleta, 2,50 metros: um gigante que representava com maestria e expressividade a imagem do esportista náutico santista. A estátua inspirada em Mariani foi, então, posta em um enorme pedestal de granito bruto, uma base retangular onde Fraccaroli esculpira em relevo, em cada uma de suas quatro faces, os símbolos das modalidades náuticas praticadas nas águas santenses: o salto, a natação, o remo e o polo-aquático. Eram estas, enfim, algumas das provas atléticas mais importantes do esporte santista, eternizadas no entorno das sedes dos grandes clubes náuticos da Ponta da Praia: Internacional, Santista, Vasco e Saldanha.

Símbolos da obra

Mas Adalberto Mariani, o esculpido em bronze, não estava só na composição do conjunto. Fraccaroli implantou alguns símbolos curiosos em seu projeto. A estátua, em princípio, tinha o propósito de representar um atleta reverenciando o mar, a sua casa esportiva. Em sua mão direita, estendida para o alto, o homem segura uma coroa de louros, símbolo de honra e vitória. Na esquerda, o outro braço dá suporte para o repouso da águia, símbolo da paciência, da tenacidade e do poder, qualidades inerentes aos esportistas. Apesar de ter como modelo o santista Mariani, a estátua lembrava o estilo greco-romano de escultura, com toda imponência e ar sóbrio.

O local escolhido para ser o repouso do monumento não poderia ter sido mais apropriado: na Ponta da Praia, sítio representativo da glória náutica. Ele foi inaugurada com pompa e circunstância na entrega da urbanização da avenida Almirante Saldanha da Gama, junto com outro grande símbolo da cidade, as muretas do canal.

Quando Santos ganhou o título de “Município Mais Esportivo do Brasil”, em 1955, a placa foi instalada no monumento do “Atleta Náutico”, símbolo da luta da cidade nos esportes.

Representatividade do esporte santista

Em 1955, o jornalista esportivo e pesquisador De Vaney (Adriano Neiva da Motta e Silva) inseriu a cidade de Santos em um concurso promovido pelo jornal O Globo, do Rio de Janeiro que, na época, estava elegendo, a partir de dados estatísticos, qual era o “Município Mais Esportivo do Brasil”. O resultado saiu no ano seguinte, com a vitória santista, que competiu com outros 2.373 municípios e venceu com larga vantagem sobre o segundo colocado, a cidade de Mangaratiba (na época tida como um grande centro esportivo brasileiro). A entrega do diploma e da placa de bronze à Prefeitura de Santos ocorreu no dia 10 de março de 1956, justamente na base da estátua do atleta náutico, na Ponta da Praia.

Troféu dos Jogos Abertos do Interior

No ano de 1946, Santos sediava pela primeira vez os Jogos Abertos do Interior. A cidade, que vinha de seis títulos consecutivos (1940-1945), e já liderava o ranking da competição chamada de “Olimpíadas Brasileiras”, resolveu forjar os troféus no mesmo formato do “Atleta Náutico”. E foi o próprio escultor Caetano Fraccaroli o desenvolvedor do molde utilizado para a produção das estatuetas, oferecidas aos vencedores de cada modalidade. Na base em miniatura, ao invés dos relevos do monumento original, vinham os das modalidades do jogos: Atletismo, Bola ao Cesto, Voleibol, Xadrez, Tênis e Natação. O conjunto de troféus custou, na época, Cr$ 20 mil (equivalente a R$ 160 mil – cerca de R$ 26 mil cada um, nos dias atuais). Na base dos troféus, vinha a data 1-9-1946.

Sobre Adalberto Mariani

Adalberto Mariani foi um dos nomes mais importantes da natação santista em todos os tempos. Ele começou sua trajetória esportiva como remador no Clube de Regatas Vasco da Gama aos 16 anos, em 1938. Logo depois, foi um dos destaques do primeiro título da cidade de Santos em Jogos Abertos do Interior, em São Carlos, 1940, conquistando a prova dos 100m livres de natação. Em 1942, já como treinador do grêmio cruzmaltino, conquistou o Campeonato Brasileiro de Natação. Posteriormente, passou a treinar as equipes de natação do Colégio Marçal (atual Santa Cecília), onde foi tricampeão colegial do Estado de São Paulo (1950, 1951 e 1952). Em maio de 1953, assumiu o posto de treinador de natação do Internacional de Regatas, e lá conquistou 21 títulos (santistas, paulistas, brasileiros e sul-americanos) em diversas modalidades, revelando grandes campeões, como Manoel dos Santos, João Augustinho de Almeida, Moacir Rebelo dos Santos, Silvia Bitran, Marion Matilde Mayer, Marlene Blanco, Henriqueta Moscatielo, entre outros. Sua saúde era invejável, mas, aos 73 anos de idade, acabou derrotado por um câncer no pâncreas, vindo a falecer em 7 de novembro de 1991. Mariani deixou muitas saudades na cidade santista, porém saudades que podem ser abrandadas durante um passeio pela orla da Ponta da Praia, onde podemos topar com um símbolo de atleta completo e absolutamente vitorioso.

Johnny Weismuller foi um nadador norte-americano, de origem romena, que se destacou mundialmente na natação, conquistando cinco medalhas de ouro em duas Olimpíadas (Paris, 1924, e Amsterdã, 1928). Sua maior fama, porém, foi construída nas telas de cinema, onde interpretou o personagem Tarzã em 1934.