D Pedro II ficou encantado com habilidade de anão santista

O monarca, em sua primeira visita a Santos, em 1846, quando tinha 20 anos de idade, conheceu um anão que era pescador e ator, de quem se afeiçoou e tornou-se amigo

Santos, 21 de fevereiro de 1846. Eram 10 horas da manhã, quando Sua Majestade, o Imperador D. Pedro II, acompanhado de membros de sua comitiva, assistia um espetáculo bucólico na praia da Barra (atual Praia do Boqueirão), protagonizado por pescadores locais. Observar os bravos homens do mar exercendo suas extraordinárias habilidades com as redes na pesca de arrastão, à beira-mar não era, enfim, algo tão extraordinário, não fosse o fato de que um daqueles caiçaras destacar-se por ter menos de um metro e meio de altura. O personagem, de singularíssima estrutura, de nome Antônio de Assis, era figura carimbada na cidade santista.

O Imperador o havia conhecido alguns dias antes, numa das chácaras que visitara durante sua estada em Santos, iniciada em 18 de fevereiro. Na ocasião, D. Pedro II ordenou aos seus assessores que fosse dado 100 réis ao anão, a título de esmola.

 Para mais apoquentá-lo, o Imperador brincou dizendo-lhe que sua “desastrada estrela o havia dotado de pernas tais, que formavam um círculo perfeito“. E ainda emendou alegando que deveria ele certamente fazer parte da comitiva do assaz nomeado general Tom Thumb (Charles Sherwood Stratton, que ficou mundialmente conhecido como “General Tom Thumb”, foi um anão norte-americano que ganhou fama na década de 1870, performando em trajes de Napoleão Bonaparte no pioneiro circo de Phineas Taylor Barnum), cuja história tomara conhecimento por meio de publicações que lera na Biblioteca da Corte.

Antônio, enfim, caiu nas graças de D. Pedro II, que se admirava ao vê-lo no mar. Todos os pescadores da região alegavam que o anão era dotado de muitas habilidades, entre elas a de nadar como um peixe. Porém, outra aptidão do diminuto homem era atuar no palco teatral da cidade, principalmente em apresentações de dança, a qual fazia dupla com um irmão, também anão.

Prestígio apenas no retorno a Santos

No dia 25 de fevereiro, D. Pedro II e sua esposa, a Imperatriz Tereza Cristina, junto com o resto da comitiva partiram de Santos rumo à capital bandeirante, onde ficaram por vinte dias. Na sequência, promoveram uma longa excursão pelo interior paulista, passando por Sorocaba, São João de Ipanema, Bom Retiro, Vila de Porto Feliz, Itu, Campinas e Jundiaí. Voltaram para São Paulo no dia 31 de março, onde tornaram a ficar por mais doze dias. Só então voltaram para Santos, onde deveriam embarcar na fragata “Constituição”, a fim de retornarem à Corte (Rio de Janeiro). Porém, antes da partida, Suas Majestades decidiram ir ao teatro, na noite do dia 13 de abril, a fim de prestigiarem o espetáculo montado pelo amigo anão. E ficaram maravilhados com o espetáculo protagonizado por Antônio e seu irmão, Manoel de Assis. 

O fato histórico foi assim narrado pelo carioca “Jornal do Commércio”: “À noite foram SS. MM. ao teatro, que aqui mantem uma companhia particular. Antes da representação a peça “O Judeu”, houve uma dança de anões, perfeitamente executada pelos dois irmãos Antônio e Manoel de Assis. Nos intervalos tocou o violinista Robbio. O espetáculo foi dado a expensas das pessoas mais abastadas e gradas desta cidade, que subscreveram para decorações e todas as outras despesas. O teatrinho estava muito associado e as duas ordens de varandas cheias de senhoras. Os atores, que o não são de profissão, saíram-se melhor do que era de esperar de curiosos: especialmente o que fez o papel de judeu mostrou capacidade e gênio mais que ordinário“.

Após o divertido espetáculo que teve como palco o teatro da cidade (que ficava onde hoje está a esquina da Rua Riachuelo com a Praça Mauá, do lado da Rua João Pessoa) o cidadão santista Antônio Ferreira da Silva deu uma canja à Corte, com rico acompanhamento de doces, vinhos e outras iguarias, à qual todos fizeram honra.

Despedida

Finalmente, às 16 horas do dia 14 de abril de 1846, o jovem monarca brasileiro, D. Pedro II, embarcava no vapor “Correio Brasileiro”, que levaria a si, sua esposa e parte da comitiva até a fragata “Constituição”, que se achava fundeada fora da barra. Ao longo das praias (nota: praias que existiam no Centro Histórico e ao longo do canal do Estuário), o povo santista acenava entusiasticamente ao Imperador, agradecendo-lhe pelo privilégio de sua augusta visita. E, entre os homens, mulheres e crianças que lá estavam, com lenços brancos às mãos, figurava em destaque o singular personagem que conquistou a todos por sua incrível vitalidade, como um pescador ímpar, um ator único, mas, principalmente, um amigo especial, que, provavelmente, nunca fora esquecido pelo líder do grande Império do Brasil.