O surfe nasceu, para o Brasil, nas águas de Santos

As águas de Santos, assim como viram o surgimento do remo no Brasil, também tiveram o privilégio de ser o nascedouro do surfe brasileiro. Mas, se no esporte náutico coletivo não foram registrados os nomes dos pioneiros, no surfe a coisa muda de figura. A modalidade da prancha tem seus “fundadores”, embora isso já tenha dado muita confusão.

Por muitos anos atribuiu-se a Osmar Gonçalves, João Roberto Suplicy (Juá) Haffers e Silvio Manzoni, o mérito da construção da primeira prancha de surfe do Brasil, a mesma que foi responsável pela origem do esporte no país. No entanto, a verdadeira história acabou sendo revelada em 2000, quando os santistas ficaram conhecendo o norte-americano radicado em Santos Thomas Rittscher Júnior, que revelou os fatos reais, depois confirmados por Jua Haffers.

Corria o ano de 1937, quando Rittscher, então com vinte anos, recebeu das mãos do pai, um próspero comerciante de café, um exemplar da revista norte-americana “Popular Mechanics” que trazia, em uma das reportagens, um artigo de Tom Blake, considerado até hoje uma das lendas do surfe mundial. Blake ensinava aos leitores como fazer a prancha que levava a sua marca pessoal, invenção responsável pela popularização do esporte das ondas pelo globo.

Foi então que Rittscher, jovem atleta do Saldanha da Gama (era nadador, remador, velejador e jogador de polo aquático), se interessou pela engenhoca do compatriota. Com o esquema revelado na revista,  montou sua prancha “Blake” nos meses finais de 1937. Assim, naquela temporada de Verão, que avançou para 1938, o “santista” de adoção foi até a praia do Boqueirão, onde “dropou” as pequenas ondas da Baía de Santos, dando o pontapé inicial para uma das modalidades esportivas mais queridas do país.

Primeira mulher no surfe

A prancha “Blake” de Thomas também foi responsável por colocar na história do esporte, o nome de Margot Rittscher que, ao brincar de “pegar onda” com a engenhoca construída pelo irmão, acabou se tornando a primeira mulher surfista do Brasil.

Osmar, Juá e Silvio

O trio que por muito tempo foi considerado pioneiro do surfe (embora não deixe de ser) entrou na história naqueles dias em que Rittscher dropava as ondas do Boqueirão com seu “brinquedo” feito em casa. Osmar, Juá e Silvio tinham mais ou menos a mesma idade, entre 15 e 16 anos, e ficaram assombrados com as evoluções do “americano”. Juá, também filho de importantes comerciantes de café, conhecia Thomas e Margot, e não pensou duas vezes antes de se aproximar e conhecer de perto a famosa prancha Tom Blake. Os três garotos, interessados em também montar uma daquelas para poder “brincar” nas ondas, pediram a revista Popular Mechanics emprestada e, com ela, partiram para a dura empreitada de construir uma prancha igual a de Rittscher. Ocorre que, pela idade e pouca experiência, eles acabaram pedindo ajuda a um engenheiro naval amigo de Haffers, que montou uma peça impecável. Logo depois, os garotos fizeram mais duas pranchas, uma pra cada um e partiram para se aventurar nas ondas santistas.

Rittscher troca de barco

Por que a história ignorou por muito tempo o pioneirismo de Rittscher? Por que o “americano” não parava quieto e vivia trocando de modalidade esportiva. Thomas não ficou muito tempo “surfando” e foi para a vela, enquanto que os garotos (Osmar, Juá e Silvio) se mantiveram fiéis ao surfe por muitos anos, o que os colocou na história como os primeiros surfistas verdadeiros, de corpo e alma.

Picuruta e família Salazar

A história do surfe no Brasil, apesar deste início em Santos, se desenvolveu em outras praias, principalmente nas do Rio de Janeiro. Porém, uma das maiores lendas brasileiras do esporte das ondas também é daqui. Trata-se de Picuruta Salazar, considerado o maior surfista brasileiro de todos os tempos, dono de quase duas centenas de títulos, o primeiro deles conquistado em 1972, no I Festival de Surf do Canal 1. Na sua extensa galeria estão dois títulos do ISA Surfing Games (Mundial por Equipes), conquistados em 1998, em Portugal,  e em 2003, na Nova Zelândia. O evento  é considerado “as Olimpíadas do Surf”, ocorrendo de dois em dois anos. Para provar que o surf está na veia da família, outros dois membros do clã Salazar também conquistaram o mundo das ondas, como o filho de Picuruta, Leco Salazar, que chegou ao vice-campeonato mundial em 2011 no estilo Stand Up Paddle (prancha com remos); e o irmão Almir Salazar, que se notabilizou no mundo do surfe como o melhor shaper profissional (fabricante de pranchas). Almir, como atleta, chegou a conquistar alguns títulos, sendo o mais importante o vice-campeonato europeu.

Guiness Book

Em 2008, Santos entrou no Guiness Book, o livro dos recordes ao colocar 100 surfistas em pé na mesma onda. No ano seguinte, os sul-africanos passaram a ser os recordistas, com 110 pessoas. Também em 2009 e 2010, os santistas fizeram novas tentativas, mas as ondas não colaboraram.

Thomas Rittscher Júnior e sua irmã, Margot, os pioneiros do surf em águas brasileiras, em imagem da década de 1930 e já no novo milênio.
Thomas Rittscher Júnior e sua irmã, Margot, os pioneiros do surf em águas brasileiras, em imagem da década de 1930 e já no novo milênio.
Artigo da revista Popular Mechanics que trata da prancha projetada por Tom Blake. Matéria deu origem ao surfe no Brasil.
Artigo da revista Popular Mechanics que trata da prancha projetada por Tom Blake. Matéria deu origem ao surfe no Brasil.
O surfista Osmar Gonçalves, na praia de Santos, nos anos 1940. Muitos atribuem a ele o pioneirismo isolado, sem conhecer a história de seus companheiros e a de Thomas Richter.
O surfista Osmar Gonçalves, na praia de Santos, nos anos 1940. Muitos atribuem a ele o pioneirismo isolado, sem conhecer a história de seus companheiros e a de Thomas Richter.
Jua Hafers e Osmar Gonçalves
Jua Hafers e Osmar Gonçalves
Jua Hafers nas ondas de Santos.
Jua Hafers nas ondas de Santos.
Picuruta Salazar, o maior nome santista do surfe de toda a história.
Picuruta Salazar, o maior nome santista do surfe de toda a história.

 

 

 

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