Na virada do século XIX para o XX, a ocupação urbana santista sobre a Ilha de São Vicente ainda era bastante tímida, abrangendo muito pouco para além dos limites do Paquetá (no leste) e Saboó (no oeste). A chamada Zona Leste, que engloba a atual orla praiana, revelava um bucólico aspecto selvagem, dotado de grandes extensões de terreno coberto por mato denso e muitos trechos alagados, os chamados “pântanos salgados”. Era um imenso viveiro de espécimes animais, inclusive alguns porcos do mato e até jaguatiricas, estas encontradas nas matas do Macuco.
As avenidas Ana Costa e Conselheiro Nébias, recém criadas artérias que chegavam à praia da Barra, quase não contavam com ruas transversais que as ligassem entre si. As exceções eram as ruas do Sol (atual Barão de Paranapiacaba) e Industrial (atual Alexandre Herculano).
Nesta época, em 1908, o projeto de saneamento do engenheiro sanitarista Saturnino de Brito já havia começado, sendo que já haviam sido inaugurados os canais 1 e 2. A avenida Ana Costa, praticamente nua de casas e ladeada por duas valas a céu aberto, era servida ainda pelo bondinho puxado à tração animal. Os morros, com exceção do Monte Serrat, não carregavam quase nenhuma moradia, revelando-se verdes e de mata densa, com muitas bananeiras.
Por falar em bananas, os terrenos à venda no Marapé eram praticamente a preço destas. Tanto que uma única empresa da capital chegou a arrematar em hasta pública, por 300 contos de réis, todas as terras do bairro e outras contíguas, de tamanho equivalente a 95 quarteirões. Foi um dos maiores assuntos do ano. Muitos santistas se perguntavam: Por que haviam comprado tanta terra sem valor?
Ledo engano. Com visão de futuro, os proprietários da empresa, denominada “Condomínio Campo Grande”, lotearam toda a área, e venderam seus terrenos de 10×50 metros por 1,5 conto de réis, cada. Só para se ter uma ideia do negócio, da área original foi possível desmembra-la em mais de 2 mil lotes.
Eles podiam não ser como as jaguatiricas ou porcos selvagens que ainda insistiam em habitar as terras santistas, mas eram feras em se tratando de negócios.
(baseado na entrevista do engenheiro João Thomaz Tangary, publicada no jornal A Tribuna, em abril de 1955)